Recessão e desemprego fizeram produtividade do trabalho recuar 7% entre 2014 e 2016
RIO - A recessão que derrubou o PIB do país por dois anos seguidos e levou o grupo de desempregados a bater recorde, ultrapassando 14 milhões, resultou em uma perda da produtividade do trabalho — indicador que mede o quanto cada trabalhador contribui para a geração de riqueza do país — na ordem de 7%, segundo estudo do Banco Bradesco. Para especialistas, o recuo preocupa porque denota uma fragilidade ainda maior da produtividade do país que, desde a década de 1980, está praticamente estagnada, crescendo em média 0,1% ao ano.
— Essa recessão brutal causou um colapso da produtividade do trabalho, que está estagnada desde 1980, com pequenas variações positivas na abertura comercial na primeira metade dos anos 1990 e, depois, nas microrreformas feitas entre 2003 e 2008. Mas esse crescimento acabou não sendo sustentável. Foi derrubado por uma combinação de investimentos em setores equivocados, que eram pouco produtivos e não deram resultado, e pela trajetória explosiva da dívida pública, que acabou com a confiança de consumidores e empresários e travou investimentos — avalia Fernando Veloso, pesquisador da área de trabalho da Fundação Getulio Vargas.
Ariana Stephanie Zerbinatti, economista e autora do estudo, diz que o recuo de 7% do indicador — resultado da divisão do PIB pelo número de trabalhadores — só não foi mais intenso porque o mercado de trabalho começou a demitir com mais intensidade apenas no segundo semestre de 2015. Essa queda, de acordo com o relatório, diz respeito ao período compreendido entre o primeiro trimestre de 2014 e o último de 2016, quando o PIB acumulou queda de 9%, e a ocupação recuou 2%.
— Pela forma como é calculada, a produtividade do trabalho, geralmente, apresenta recuo em períodos de crise, visto que o emprego tende a apresentar quedas menos intensas que o PIB. Ainda assim, esperamos alguma melhora da produtividade do trabalho este ano, encerrando com alta de 1%, graças à retomada gradual da atividade econômica, que deve crescer 0,3%. O mercado de trabalho ainda vai reagir de forma defasada a essa recuperação. A retomada da produtividade se dará mais pela produção do que pelo emprego — ressalta Ariana.
Para Cláudio Dedecca, economista da Unicamp especialista em mercado de trabalho, esse recuo mostra que o país está deixando de usar a sua capacidade de trabalho para potencializar a riqueza do país:
— É um dado preocupante, porque cada trabalhador brasileiro passou a produzir menos. A contribuição dele para o PIB reflete uma recessão muito violenta. Um elemento que tem de ser levado em conta decorre do fato de o Brasil ter uma dinâmica de produtividade muito ruim. Precisamos de muita gente para gerar um PIB que não é tão grande assim. Durante muito tempo, o emprego formal cresceu o dobro do PIB. Essa fragilidade foi amplificada pela recessão.
Para Dedecca, essa perda de produtividade impacta ainda mais na competitividade do país, o que reforça a dificuldade de uma retomada da atividade a níveis expressivos, acima de 6% ao ano, e sustentável, como é o caso da China, exemplifica.
Otto Nogami, professor de economia do Insper, no entanto, é mais otimista. Ele defende que, em um processo de retomada da economia como o país está vivendo, essa produtividade baixa pode se tornar um benefício:
— Já existe capacidade instalada, que está ociosa. Então, quando a demanda voltar a crescer, é só produzir mais com o mesmo quadro. Você consegue recuperar rapidamente o índice de produtividade. É o que ocorre nas economias americana e europeia, onde, com os mesmos recursos humanos, se produz mais, capacitando as pessoas e adicionando ferramentas.
Na comparação com outros países, a baixa produtividade do trabalho no país chama atenção. De acordo com Veloso, enquanto entre 1980 e 2015, a produtividade americana cresceu 1,5% ao ano, e a do Chile, 1,8%; a do Brasil não saiu do lugar, com 0,1%. De acordo o Bradesco, comparando a produtividade do trabalho dos países que passaram por crises recentes, o recuo brasileiro foi bastante próximo ao ocorrido na Grécia (-7,3%). Apesar da crise de duração semelhante à do Brasil, lá a contração do PIB foi bem maior, de 20%, e houve um ajuste mais profundo nos empregos. Já na Itália e nos EUA, as contrações da produtividade foram menores do que no Brasil, porque ambos tiveram quedas menos intensas do PIB e crises de menor duração.
Setorialmente, o estudo aponta que a queda mais intensa da produtividade foi registrada pela construção civil, com recuo de 17,6% entre o primeiro trimestre de 2014 e o último de 2016. O resultado, explica Ariana, reflete a queda de aproximadamente 20% do PIB do setor no mesmo período, ao passo que o emprego caiu cerca de 2%. Queda em magnitude semelhante registou o comércio, de 17,2%.
— São setores que cresceram bastante nos anos 2000, muito por conta da expansão do acesso ao crédito. Realidade que foi totalmente revertida durante a recessão — opina Veloso.
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