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Hospitais nos EUA adiam até transplantes para abrir espaço a pacientes de coronavírus

Por Folha de São Paulo

25/03/2020 19h32 — em
Mundo



WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - O avanço do coronavírus nos EUA ganhou contornos dramáticos há 15 dias, quando hospitais começaram a desmarcar transplantes como forma de otimizar o uso de recursos médicos e leitos disponíveis para tratar os infectados pela pandemia no país.

Em 13 de março, o presidente Donald Trump declarou emergência nacional por causa do novo vírus, os casos confirmados em território americano explodiram, e os profissionais de saúde se viram diante da necessidade imposta de escolher qual vida será preciso salvar.

Procedimentos considerados não urgentes foram cancelados, como já acontece em vários lugares do mundo, mas alguns hospitais americanos decidiram suspender cirurgias inclusive em casos mais críticos, selecionando atender somente a pacientes que corram risco grave de morrer.

Segundo a Unos, entidade que acompanha o fluxo dessas cirurgias nos EUA, o número de transplantes de rim e fígado caiu até 80% em março, se comparado com o pico de procedimentos de 2020, registrado em janeiro.

Na segunda semana do ano, foram 156 transplantes de rim e fígado com doadores vivos no país enquanto na semana passada esse número despencou para 31.

Presidente da Sociedade Americana de Transplantes, Emily Blumberg confirma os cancelamentos, mas diz que os programas de transplantes nos EUA devem balancear a necessidade aguda e os benefícios da cirurgia com os riscos potenciais, "visando sempre a segurança do paciente."

"É preciso considerar se um paciente é estável em seus tratamentos atuais e, portanto, pode ter o transplante atrasado, e se há um doador adequado e seguro", explica Blumberg à reportagem. "Os recursos da instituição médica também precisarão estar disponíveis."

Dessa forma, têm sido adiados ou cancelados procedimentos de pessoas que precisam de um novo rim, por exemplo, mas ainda conseguem sobreviver mais um tempo com diálise.

O Hospital da Universidade do Colorado é um dos que decidiram suspender seu programa de transplantes de fígado e rim com doadores vivos por pelo menos duas semanas.

Em comunicado à NBC News, Elizabeth Pomfret, chefe do departamento de transplantes do UCHealth, diz que seguiu as recomendações diante da pandemia mundial para tomar a decisão.

"Nós e o restante da comunidade de transplantes não acreditamos que a escolha de imunossuprimir um receptor e expor um doador a riscos excessivos no momento seja do interesse do doador ou do receptor."

Aos 33 anos, Zach Branson estava na fila de transplantes do hospital em Colorado.

Sua cirurgia para corrigir uma doença rara no fígado estava marcada para esta quarta-feira (25), mas foi adiada.

Branson afirma que seu estado é crítico e que, sem o transplante, teria de 30 a 45 dias de vida. Diz ainda que tanto ele quanto seu tio, que seria o doador de parte do órgão, estavam dispostos a correr riscos de contaminação do coronavírus para tentar o transplante que poderia prolongar sua vida.

Procurado pela Folha para informar se havia nova data para a cirurgia de Branson, o hospital não respondeu.

Desde o meio de março, quando a situação do vírus nos EUA começou a piorar, médicos têm cancelado visitas de rotina no caso de transplantes para evitar possíveis contágios --pessoas que aguardam a cirurgia estão no grupo dos mais vulneráveis a infecções-- e dizem que o atraso na divulgação de resultado dos testes também atrapalha as cirurgias que ainda estão sendo realizadas.

Isso porque, antes de entrar no centro cirúrgico, o paciente precisa ser testado para o vírus, mas os resultados nos EUA levam de cinco a sete dias, o que pode ser crucial para um receptor em estado crítico.

A demora no processo dos testes é um dos principais gargalos do sistema de saúde americano durante a crise e por algum tempo maquiou o número de casos confirmados no país.

Em pouco mais de 20 dias, os diagnósticos de coronavírus saltaram da casa de centenas para quase 60 mil, com pelo menos 804 mortes --e drenaram recursos de laboratórios e hospitais.

A escassez no número de respiradores, por exemplo, tem sido foco de disputa entre a Casa Branca e estados mais atingidos pela pandemia.

O governador de Nova York, o democrata Andrew Cuomo, por exemplo, afirmou que tem 11 mil ventiladores disponíveis e precisaria de ao menos 30 mil para tratar os mais de 30,8 mil casos confirmados no estado.

O estoque nacional estratégico da Casa Branca, porém, só possui 16,6 mil ventiladores armazenados, segundo o site The Center Public Integrity, e Trump afirmou que mandou 4.000 a Nova York.

O avanço do coronavírus tem movimentado a bússola da crise desde a China, seu ponto de origem, passando pela Europa, e, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), pode se fixar nos EUA nos próximos dias.

Desde o fim de janeiro, o país já passou pela fase de minimizar a pandemia - impulsionada pelo discurso de Trump-- para, em seguida, dar gravidade ao assunto.

O presidente anunciou uma série de medidas de isolamento e estímulos fiscais nas últimas duas semanas, mas, desde segunda-feira (23), dá indícios de querer relaxar as regras de distanciamento social, com medo de que a paralisia econômica tenha impacto na sua campanha à reeleição.

Trump disse que o país deve voltar a funcionar até a Páscoa, em 12 de abril, mas o quadro de saúde pública não parece estar preparado para a normalidade num prazo de menos de 20 dias.

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