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Ala para indígenas com Covid-19 é inaugurada em Manaus, mas lideranças exigem interiorização

Por Folha de São Paulo

26/05/2020 22h06 — em
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MANAUS, AM (FOLHAPRESS) - O ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, inaugurou nesta terça-feira (26) uma ala para tratamento de indígenas com Covid-19 dentro de hospital de retaguarda do governo estadual do Amazonas, em Manaus. Para lideranças, a medida é insuficiente por se concentrar apenas na capital.

A ala tem 53 leitos, dos quais 20 de alta complexidade. As adaptações para os indígenas incluem a instalação de redes e um espaço para rezas tradicionais. Trata-se de uma parceira entre o governo Wilson Lima (PSC) e o Ministério da Saúde.

O hospital só atenderá o Amazonas, o estado com a maior população do indígena do país. Segundo o IBGE, são 183,5 mil indígenas, dos quais 70% morando em aldeias.

Além da ala no hospital estadual Nilton Lins, indígenas de Manaus passaram a ter prioridade no hospital de campanha Gilberto Novaes, gerido pelo grupo privado Samel em escola cedida pela prefeitura da cidade, comandada por Arthur Virgílio Neto (PSDB).

Uma das principais preocupações das lideranças indígenas --e dos prefeitos das cidades do interior-- é com a dificuldade de remoção de doentes até Manaus.

Apesar de o Amazonas ter um território comparável à soma das regiões Sul e Sudeste, apenas a capital dispõe de UTI. O governo estadual tem seis aeronaves para remoção, com capacidade para até dois pacientes cada uma.

"Somos 51 kokamas mortos", diz a liderança Milena Kokama, sobre seu povo, que habita a região de Tabatinga (1.100 km em linha reta de Manaus). Para ela, o correto seria ter um hospital de campanha no Alto Rio Solimões, onde vivem cerca de 70 mil indígenas em aldeias e outros milhares nas cidades.

"Isso aqui é um beleza, mas para quem? Quantos parentes vêm de lá? O último que trouxeram morreu no mesmo dia porque não tinha mais jeito. É só faz de conta? E depois não pode devolver o corpo", diz Milena, que acompanhou a inauguração.

Na mesma linha, o presidente da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), Marivelton Baré, diz que o ideal seria aprimorar o atendimento em São Gabriel da Cachoeira, a 850 km em linha reta de Manaus e, como Tabatinga, só acessível por avião ou barco. "Pode amenizar, mas não resolver os problemas, a depender da demanda."

Tanto na região de São Gabriel, que tem 741 casos confirmados, como no Alto Rio Solimões, que registra municípios entre as maiores taxas de incidência do país, o novo coronavírus já circula nas aldeias, muitas delas de difícil acesso e pouca comunicação.

Único deputado indígena do país, Joênia Wapichana (Rede-RR) afirma que é "uma conquista importante dos indígenas que moram em Manaus, em contexto urbano, e que vai beneficiar também os indígenas que vem de outras regiões do Estado".

Por outro lado, a parlamentar defende a estruturação dos Dseis (Distritos Especiais de Saúde Indígena), subordinados à Sesai, e dos municípios do interior "para que a população indígena possa ser atendida o mais próximo de onde vive".

RAMBO E BRUCE WILLIS

"Vai haver hospitais em outros lugares? Não sei, vai depender do avanço da doença", afirma Robson Silva, que comanda a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, em entrevista coletiva após visitar a ala.

A Sesai é responsável pela atenção primárias apenas a indígenas aldeados. Sua estrutura conta com 14 mil profissionais divididos em 800 equipes pelos 34 Dseis em todo o país.

"O próprio conceito o hospital de campanha está um pouco tumultuado. Às vezes, a gente imagina um monte de barraca, o Bruce Willis descendo de helicóptero, o Rambo chegando. [Mas] o hospital de campanha lá no interior tem de ter eletricidade, logística. E, quando montar tudo, o surto já passou."

Silva afirmou que haverá repasses do governo federal para aumentar a ajuda a municípios que atendem a indígenas, como São Paulo de Olivença (AM).

Pazuello cancelou a sua participação na entrevista, embora estivesse no hospital. Sua assessoria informou que ele precisou participar de reuniões.

De acordo com o boletim diário da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) desta terça-feira, morreram 143 indígenas em decorrências da Covid-19, dos quais 99 no Amazonas. Com 51 óbitos, os kokamas são o povo com mais vítimas.

Na contagem da Sesai, que só registra casos entre indígenas aldeados, há 40 óbitos, dos quais 19 no Dsei Alto Rio Solimões, na região de Tabatinga.

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