Garis readaptados atuam em viveiros de plantas e constroem obras de arte

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Por Ana Celia Ossame, especial para Portal do Holanda

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Há três anos, Raquel Oliveira dos Santos, 56, deixou, por recomendação médica, o trabalho de gari nas ruas onde atuou por 32 anos, para trabalhar no viveiro de plantas mantido pela Secretaria Municipal de Limpeza Pública (Semulsp) para abastecer os locais onde as mudas são plantadas.
A atividade dos garis, que é como são chamados os trabalhadores da coleta da limpeza pública, não é de risco somente pelo manuseio dos resíduos lançados pela população. É também perigosa diante das ocorrências de acidentes de trânsito, cortes e quedas durante o trabalho e os deslocamentos necessários.
“Nas ruas a gente corre risco, especialmente à noite, onde a gente vê muita coisa feia” explica ela, que no viveiro prepara as mudas de plantas ornamentais e frutíferas para serem usadas na arborização de jardins e outros espaços.
Essa atividade vem ganhando destaque especial na atual administração do secretário Sabá Reis, que estimula a atuação dos garis mais antigos da Prefeitura, especialmente das mulheres, para novas funções.
Nesse propósito, está reformando algumas áreas como a Lagoa do Bombeamento, no bairro da Compensa, Zona Oeste, onde vai inaugurar um espaço para lazer da população com algumas obras de arte produzidas por garis como José Edson Araújo, 56, que está há 14 anos no viveiro para onde foi readaptado após sofrer um acidente de trânsito durante o trabalho nas ruas.
José usa os materiais de reciclagem como arame, madeira, plástico, alumínio e areia para fazer obras de arte como um jacaré, lixeiras semelhantes às usadas no Central Park de Nova York, nos Estados Unidos.
Na pintura dos espaços laterais da Lagoa, que foi despoluída e tem até peixes como cará, Altevir Uchoa, 59, outro gari que por acidente teve que sair do trabalho nas ruas, desenha animais como jacarés, plantas e outras figuras com um colorido de chamar a atenção.
A ideia dele é que o trabalho seja um instrumento de educação ambiental, da mesma forma que alegre os olhos dos visitantes da lagoa, a ser inaugurada no próximo dia 1º de Maio.
A readaptação no viveiro foi uma alternativa importante para Maria Raimunda Silva de Castro, 54, onde está há sete anos, outra que sofreu acidente no trabalho.
Raimunda afirma não ter vergonha de usar a farda de gari quando se desloca de casa para o trabalho ou vice e versa. Isso porque lembra com tristeza de um tempo em que as pessoas chegavam a jogar lixo sobre elas, quando estavam trabalhando nas ruas.
“A gente já foi muito humilhada por ser gari, mas hoje as pessoas têm mais respeito e sabem da importância do que fazemos”, diz ela, que é casada e com esse trabalho cria três filhos com deficiência de uma irmã falecida.
Raquel Oliveira dos Santos, 52, chegou a trabalhar 32 anos nas ruas com a limpeza e há três está no viveiro de plantas. “Aqui a gente não enfrenta os perigos do trabalho noturno e mesmo de dia nas ruas”, afirma.
Outro artista do grupo de readaptados é Luiz Cláudio Azevedo da Silva, 52, cujas obras enchem os olhos de quem entra na área da Lagoa do Bombeamento. Um sapo gigante é uma das suas obras mais bonitas, feiras de arame, ferro e cimento.
Mas uma está sendo preparada para homenagear as vítimas da Covid-19, que é um homem segurando um pulmão, feita de arame, alumínio e ferro, que deverá ser exposta no cemitério público.
Para Luiz, a arte é o dom que transforma lixo em objetos reaproveitáveis e, se não pode ser chamado de luxo, como ousou fazer o carnavalesco Joãozinho 30, no desfile da Escola de Samba Beija Flor no ano de 1989, no Rio Janeiro, pode sim ser denominado objeto de arte digno de aplausos. “Não tem quem não se admire”, afirma Luizinho, como é conhecido entre os amigos.
Para ele, o lixo pode ser sim transformado em luxo, deixando de prejudicar a população para encher os olhos de alegria, cores e arte. “Eu faço a minha parte para que isso aconteça”, comemora.

ASSUNTOS: Amazonas