'Dreams', para PS4, já foi usado para reproduzir 'Twin Peaks', 'Star Wars' e 'Sonic'
FOLHAPRESS - "Dreams" é um jogo de criar outros jogos com o potencial de ser a matéria-prima de uma nova geração de artistas. Ênfase em potencial, pois há percalços.
Lançado oficialmente há alguns dias para PlayStation 4, "Dreams" se divide em dois grandes verbos: criar e jogar.
A primeira parte proporciona a elaboração de jogos de alta complexidade. É a ferramenta de desenvolvimento mais poderosa disponível para console, próxima de um motor profissional. Dentro de "Dreams" é possível conceber obras de todos os grandes gêneros de games, de RPG a corrida em 3D sem precisar digitar nenhuma linha de código.
São oferecidas soluções de arquitetura, lógica, personagem, música, física, efeitos sonoros, escultura, animação, entre muitos outros tópicos, de maneira integrada, sem necessidade de abrir outra janela ou programa. Fartos tutoriais e missões fazem de "Dreams" um curso robusto de design de jogos.
A sensação é de se fazer um jogo jogando, sem aquela cara de programa chato e difícil.
É um salto enorme comparado com "Super Mario Maker 2", recente lançamento do gênero "jogo de criar jogo", para o console Switch. O título da Nintendo se limita a fases de visão lateral estilo popularizado pelo próprio herói símbolo do estúdio japonês.
Em comparação com "Dreams", a interface de "Mario Maker 2" é mais divertida, com sons e elementos carismáticos, parte do repertório do público desde os anos 1980. O estúdio inglês Media Molecule tenta compensar isso com uma interface onírica e tutoriais em tom infantojuvenil. Longe do poder de atração do famoso encanador, ao editar um jogo o avatar do usuário é uma bola peluda que faz caretas insípidas.
Para provar que "Dreams" vai muito além de Mario, o estúdio disponibilizou exemplos concebidos dentro do próprio jogo. O mais robusto modelo é "O Sonho de Art", narrativa intrigante e melancólica de cerca de duas horas e meia. É uma exibição de possibilidades, com jogabilidade de ação, plataforma, investigação, navinha, entre outras.
Experimentar os engenhos de outros usuários, o outro grande momento de "Dreams", é mais problemático. Publicados em uma espécie de rede social, o ambiente lembra o YouTube, com curtidas e seções temáticas. Há seções e filtros para os mais populares, eleitos pela Media Molecule, animações, exposições de artes visuais, entre outros.
A diversidade postada na plataforma é enorme e tende a crescer e ficar mais qualificada nos próximos dias, com mais pessoas aprendendo a usar as ferramentas. No momento, mesmo os jogos mais destacados pela curadoria parecem versões empobrecidas de títulos completos.
Boa parte das criações são homenagens a outros artefatos culturais. Há cenas do seriado "Twin Peaks", recriações de "Star Wars", fases com o Sonic, protótipos de "Cuphead" em 3D e toda sorte de propriedades intelectuais alheias. Enquanto os vulcões dos departamentos jurídicos permanecem adormecidos, convém aproveitar a reprodução de "P.T.", a obra de terror psicológico de Hideo Kojima removida dos canais oficiais.
"Dreams" é forte nas experiências rápidas de poucos minutos. É uma bem-vinda adição ao horizonte dos videogames, com pouco espaço para "curtas-metragens". O destaque nesse quesito é a surpreendente e intensa experiência de menos de dez minutos "Galaxy Cadet 2020", criado pelo usuário RbdJellyfish.
Boa parte do futuro do jogo está nas mãos desses usuários de nome complicado. Eles determinarão se a plataforma criada pela Media Molecule é realmente eficiente para a concretização de sonhos.
Um desestímulo é o acesso restrito dos jogos somente a outros donos de "Dreams". É como se fosse necessário comprar um programa de edição da Adobe para abrir uma foto ou filme.
Deveria haver outra opção de acesso para quem quer só jogar. Poderia ser oferecida uma versão gratuita ou barateada sem as ferramentas de desenvolvimento de games.
Essas barreiras ao redor de "Dreams" são compreensíveis do ponto de vista dos negócios. O título é o primeiro grande exclusivo da Sony em 2020 e a decisão de compra de um console passa por essa oferta.
Mesmo assim, "Dreams" teria muito a ganhar enquanto proposta se contasse com uma adaptação para computadores. O uso do joystick do PlayStation 4 como ponteiro é bom, mas ainda está longe da comodidade e ergonomia da dupla mouse e teclado. Fora que o computador dialoga facilmente com outros programas e arquivos. Com mais abertura, "Dreams" poderá atingir seus ambiciosos objetivos.
DREAMS
Direção: Mark Healey, Alex Evans, David Smith, Kareem Ettouney
Publicadora: Sony Interactive Entertainment
Estúdio: Media Molecule
Avaliação: bom
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