Experiente e criativa, Osesp celebra a fruição da música acústica ao vivo
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(FOLHAPRESS) - No dia em que foi noticiada a morte da compositora russa Sofia Gubaidúlina (1931-2025) -um dos principais nomes da composição musical dos últimos cinquenta anos- a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) inaugurou sua temporada de assinaturas do ano. A artista havia estado em São Paulo em 2009 como convidada da orquestra, que apresentou um concerto memorável com suas obras.

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Com os músicos já posicionados no palco para as grandiosas "Quatro últimas canções" de Richard Strauss (1864-1949), o que se ouviu antes de tudo foi o "Crucifixus", breve peça para coro "a cappella" do compositor Antonio Lotti (1667-1740), que viveu na Veneza de Vivaldi.
O Coro da Osesp, porém, não estava no palco: com as placas acústicas do teto da parte posterior da Sala São Paulo elevadas, as vozes invisíveis eram ouvidas vindas de cima, entrando pelas laterais, e daí tomando a sala. No palco, ligando céu e chão, o maestro Thierry Fischer se conectava com os cantores através de uma câmera.
Essa união entre tecnologia e conhecimento pleno de todas as possibilidades acústicas da Sala São Paulo é uma das marcas da Osesp madura.
Sem interrupção -e enquanto o teto do fundo da sala era sutilmente movido de volta para baixo- a orquestra atacou a obra derradeira de Strauss, tendo como solista convidada a soprano sul-africana Masabane Cecilia Rangwanasha.
Para quem conhece suas gravações mais recentes, ouvi-la ao vivo é uma experiência imensamente superior. Nenhum exagero nos vibratos, voz com muito corpo e calor, belíssima sustentação nos graves, e o tônus expressivo necessário para reviver os poemas de Hesse e Eichendorff musicados pelo compositor alemão em seu último ano de vida.
Na escalação da Osesp, uma surpresa: a presença do violinista e maestro Cláudio Cruz, que volta a atuar, agora como "spalla convidado", dividindo a estante com o oficial Emmanuele Baldini. Foi emocionante ouvir o solo de Cruz em "Ao adormecer", antecipando a melodia cantada em seguida pela soprano: "e minha alma, sem amarras, deseja flutuar com as asas livres para, na esfera mágica da noite, viver uma vida profunda e múltipla".
Após o intervalo veio a "Sinfonia nº5", de Gustav Mahler (1860-1911), obra composta nos primeiros anos do século 20. A Osesp e seu público acostumaram-se a Mahler na última década, e frequentemente suas sinfonias têm sido escolhidas para os concertos de abertura e/ou encerramento das temporadas.
Mais do que isso, os anos 2010 viram ao menos dois ciclos completos com as nove sinfonias do compositor checo-austríaco, uma delas a cargo de Marin Alsop, que antecedeu Fischer na direção da orquestra, e outra dividida entre diferentes regentes convidados.
Fischer também está fazendo um ciclo completo, mas, pela primeira vez, a Osesp está gravando a integral mahleriana (também a Filarmônica de Minas Gerais está registrando um ciclo com essas obras). Já foram gravadas por Fischer e Osesp as três primeiras sinfonias, e durante esta temporada será a vez da "Quinta" e da "Sexta".
Há quem não reconheça em Fischer uma "índole mahleriana" típica, mas seu trabalho nesse repertório merece total consideração. Ele jamais busca o efeito fácil: mantém a elegância em meio a caos e recusa toda violência desmedida. Nunca perde o domínio fraseológico -por mais complexo que sejam as interações entre os naipes-, e a equalização sonora é sua obsessão.
Obsessão é também característica do próprio Mahler, que parece escrever e reescrever sua obra na nossa frente, em tempo real, recomeçando sempre e de novo, na busca pela mágica da beleza.
Os metais da Osesp estão em um momento em que a boa forma se alia à experiência: nesta quinta-feira (13) os solos de trompete e trompa foram magníficos. E as cordas são capazes de dezenas de planos de pianos e pianíssimos, como mostraram no famoso "Adagieto", o quarto e mais famoso movimento da obra, utilizado com gosto pelo cinema -do mais recente "Tár" (2022) ao clássico "Morte em Veneza" (1971).
A sinfonia que começa fúnebre termina para cima e, no fim, na Sala São Paulo lotada, há de se festejar a insubstituível fruição da música acústica ao vivo.
OSESP COM THIERRY FISCHER E MASABANE CECILIA RANGWANASHA
Avaliação Ótimo
Quando Sex. (14), às 20h, e sáb. (15), às 16h30
Onde Sala São Paulo - pça. Júlio Prestes, 16, São Paulo
Preço R$ 42 a R$ 295

ASSUNTOS: Arte e Cultura