A CPMI, a suposta tentativa de golpe e fronteira de um estado de exceção
Os atos de 8 de janeiro em Brasília foram uma tentativa de golpe de estado ou um badernaço previsível, que as autoridades não tiveram o cuidado de se precaver? Parece claro que o novo governo que tomou posse em 1o de janeiro subestimou os radicais que ou ocupavam as calçadas do Comando Militar em Brasília ou chegavam de ônibus à capital federal. O que fizeram foi vandalismo puro, que merece punição exemplar. Mas falar em golpe é um exagero, pois não houve mobilização para tomar o governo, nem dos militares nem de parcela importante da sociedade civil. Golpes têm esses dois elementos, que faltaram nos atos de 8 de janeiro.
Esse é um assunto sensível numa País ainda dividido. Mas é preciso ser minimamente honesto ao analisar o badernaço de janeiro. Primeiro, não havia uma liderança clara do movimento. Podia haver incentivadores, financiadores que, se tinham como objetivo tomar o governo, não depredariam a Suprema Corte, o Congresso Nacional e o Palácio do Planalto. Simplesmente ocupariam esses prédios, respaldados por força militar. O que não houve. Portanto, intenção de golpe descartada.
Foi um atentado à democracia? Toda baderna, toda depredação de prédios, toda forma de violência coletiva são atentados à democracia.
Mas como a imprensa, os tribunais, os políticos estão tratando essa questão? Da forma mais estranha possível. Ao defenderem a democracia se chocam com os limites de um Estado de exceção. Os presos estão tendo punições antecipadas, com responsabilização penal que passa por cima do devido processo legal e a ampla defesa. Ou não teriam a prisão preventiva estendida.
Então há uma novidade em curso: uma Comissão Mista composta por deputados e senadores sendo formada para apurar os fatos ocorridos em janeiro. Muitos acham inoportuna, mas cabe ao Legislativo essa tarefa. Com a CPMI os brasileiros poderão ter amplo acesso a informações que por enquanto são restritas ao Judiciário.
O que se repassa a todos é a postura centralizadora do ministro Alexandre de Moraes, que ora é investigador, ora juiz, não proporcionando a equidistância necessária dos atos de polícia, com notória violação do princípio do juiz imparcial, procedimento exigível pela nova lei, a de nº 13.964.
Moraes tem dito que “é inconstitucional a conduta que tenha o objetivo de controlar, destruir a força do pensamento crítico”. E tem razão. Mas qual a relação disso com o badernaço de Brasilia? É verdade, também - sejamos justos - a sua alegação de que “os atos de 8 de janeiro pleitearam o arbítrio, a violência e a quebra dos princípios republicanos”. Pleitearam, disse apropriadamente o ministro. Excederam-se numa reivindicação que seria tolerável em uma democracia. Todos podem dizer o que pensam, menos fazer o que pensam. Não tudo…
Moraes e a Casa que ele representa, agora precisam considerar a relevância dos trabalhos a serem implementados pela CPMI, que, com poderes de juiz, mas sem julgar, vai coletar com a precisão necessária todas as informações pertinentes ao caso, revelar o grau de participação ou de omissão de autoridades alheias ao bolsonarismo, mas agindo no sentido de que a Lei seja aplicada indistintamente.
Ganhará o Judiciário, que terá um órgão que legitimamente representa a sociedade a somar nessas investigações que tem alto interesse público; ganhará o STF que poderá trilhar por outra linha de convicção nos julgamentos, e ganharão os investigados, que poderão ser beneficiados com outros olhares, diversos daqueles que até então estão enfrentando.
ASSUNTOS: Alexandre de Moraes, Bolsonaro, CPMI, Lula
Raimundo de Holanda é jornalista de Manaus. Passou pelo "O Jornal", "Jornal do Commercio", "A Notícia", "O Estado do Amazonas" e outros veículos de comunicação do Amazonas. Foi correspondente substituto do "Jornal do Brasil" em meados dos anos 80. Tem formação superior em Gestão Pública. Atualmente escreve a coluna Bastidores no Portal que leva seu nome.