A invasão da vida privada pelo poder político
- Escutas, clandestinas ou não, afrontam a democracia, mas se tornaram uma indústria no Brasil, ameaçando a vida em sociedade.
Não foi surpresa a descoberta de que a Agência Brasileira de Inteligência monitorava políticos adversários do ex-presidente Bolsonaro. Surpresa foi a dimensão dada à operação desta quinta-feira pela Polícia Federal, “desbaratando” o grupo composto por policiais recrutados para entrar na vida privada dos desafetos do ex-presidente
Num país que estimula o denuncismo, com os órgãos de controle incentivando que delações sejam feitas de forma anônima, essa invasão da vida privada se tornou uma indústria.
São maletas circulando sem controle, conversas gravadas, arapongas invadindo celulares, escutas sendo colocadas em escritórios e carros, câmeras nas ruas controlando não apenas como o motorista dirige o seu carro, mas que rumo toma, onde para, com quem conversa. Tudo isso serve a um propósito: controlar a vida do cidadão.
Voltando para os órgãos de inteligência, no caso da Abin, ligada diretamente ao gabinete de assuntos institucionais ou ao gabinete civil e ao presidente de plantão, “o melhor serviço” é jogar o jogo de resultados - o não republicano - que contempla controle do inimigo e amplifica os interesses do poder dominante.
Isso ocorreu no governo Bolsonaro e muito provavelmente nos governos anteriores, com a agência comportando outro nome. Talvez no atual, também. Afinal, ninguém é de ferro…
E ninguém está imune a esse tipo de atitude que afronta a democracia e, muito particularmente, a vida em sociedade.
Hoje é quase impossível não suspeitar que ao confidenciar um segredo a um amigo este não o esteja gravando.
Nem os casais escapam no momento da intimidade: no motel se descobre uma câmera oculta. Nesse mundo de novas tecnologias, a vida privada (dos outros) vale ouro. E na política ela tonifica o poder e é arma eficaz para destruir reputações.
ASSUNTOS: abin, Bolsonaro, lula PF
Raimundo de Holanda é jornalista de Manaus. Passou pelo "O Jornal", "Jornal do Commercio", "A Notícia", "O Estado do Amazonas" e outros veículos de comunicação do Amazonas. Foi correspondente substituto do "Jornal do Brasil" em meados dos anos 80. Tem formação superior em Gestão Pública. Atualmente escreve a coluna Bastidores no Portal que leva seu nome.