Nomes de 'quase ninguém' tornam-se número na tragédia de Manaus: 8
Muitas famílias perderam suas casas durante as chuvas das últimas semanas. E vidas foram ceifadas. A chuva é um milagre. Quando cai sobre um barracão de zinco fala a linguagem dos anjos, enquanto alimenta a floresta e semeia a Terra. Mas como se tivesse vida própria, segue seu caminho e avança na busca dos rios e lagos, levando o que encontra pelo caminho. Se o barracão está um uma encosta, ele cai e tudo vira um grande pesadelo.
Manaus viveu seu pesadelo em reprise - nos últimos 20 anos ao menos 40 tragédias foram registradas, mas nunca como agora - com oito mortos e centenas de desabrigados.
De quem a culpa? Do Poder Público? Em parte sim, em parte de toda uma elite política que alimenta invasões, seja porque a cada bairro que surge cria-se um reduto eleitoral, seja porque prevalece a hipocrisia de que “todos têm direito a uma moradia digna”. O que é verdade - é direito - mas a prática é outra.
Invasões de terras tornaram-se um negócio do qual participam o crime organizado e as milícias, com a conivência de políticos - os mesmos que incitam a população a impedir a instalação de medidores externos em visível apoio ao furto de energia.
Quer dizer, na prática, até nas tragédias essas aves de rapina lucram, pois fingem uma solidariedade que não têm. Não compreendem a dor dos outros, não compartilham dela, apenas exploram uma fragilidade latente, claramente manipulável, que sabem que mais tarde pode resultar em votos.
Volta o verão e tudo se acalma. Novas invasões acontecem, patrocinada em muitos casos por políticos, encostas são ocupadas. Cinco meses depois o inverno retorna, com a chuva semeando a terra, alimentando as árvores.Um ciclo importante para a sobrevivência da vida, mas as tragédias voltam a acontecer.
E ninguém aprende, ninguém se importa. Afinal, quem morre geralmente se chama José, Chico e Maria. Gente que não é lembrada nem na morte.
No caso da tragédia do Jorge Teixeira, tornaram-se apenas número de uma estatística trágica: 8
ASSUNTOS: chuvas, desabrigados, Jorge Teixeira, Manaus
Raimundo de Holanda é jornalista de Manaus. Passou pelo "O Jornal", "Jornal do Commercio", "A Notícia", "O Estado do Amazonas" e outros veículos de comunicação do Amazonas. Foi correspondente substituto do "Jornal do Brasil" em meados dos anos 80. Tem formação superior em Gestão Pública. Atualmente escreve a coluna Bastidores no Portal que leva seu nome.