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OAB não é um apêndice do Judiciário


Por Raimundo de Holanda

14/08/2023 20h28 — em
Bastidores da Política


  • Alguém precisa 'beliscar' o Beto Simonetti, presidente da Ordem, e dizer que ele precisa se manifestar. Afinal, o caso da sanção imposta a um advogado por ministro do STJ caracteriza intromissão de um magistrado em atribuições da OAB, que afinal não é um apêndice do Poder Judiciário…

Muita gente pensa que sou advogado. Não sou. Embora tenha ingressado no curso de direito por duas vezes e desistido. A razão é simples: a descrença no sistema de justiça. Olho para trás e se passaram 40 anos das duas tentativas, tempo em que vi surgirem muitos advogados - uma minoria com qualidade, e uma outra parte ganhando a vida dirigindo Uber. Os tribunais ganharam mais juízes, mas a qualidade também piorou.  Um dia decidem uma coisa, em outro recuam. Intrometem-se no Legislativo e no Executivo, invadindo atribuições de outros Poderes. Pior, julgam-se os únicos defensores da democracia, mas é a democracia deles, não o sistema de governo que trilha o caminho da liberdade de expressão e de opinião, de fazer negócios, de ir a igreja manifestar sua crença, de ter uma ideologia (de direita, sem ser golpista), ou de esquerda, sem ser tachado de comunista.  

Os casos de excessos são muitos. O mais recente partiu do ministro Benedito Gonçalves, do STJ, que puniu um advogado por suposta litigância  de má fé, além da multa em dobro – já havia aplicado multa anterior, determinando ainda o bloqueio temporário de acesso ao sistema de peticionamento do TSE.

A sanção imposta é comparável a uma suspensão de natureza disciplinar, que somente pode ser tomada pela Ordem dos Advogados do Brasil. 

Alguém precisa beliscar o Beto Simonetti, presidente da Ordem, e dizer que ele precisa acordar e se manifestar. Afinal, o caso de sanção a um advogado por ministro do STJ  caracteriza  intromissão de um magistrado em atribuições da OAB, que afinal não é um apêndice do Poder Judiciário.

O advogado talvez tenha usado termos inadequados em sua petição, mas Gonçalves afirma em seu despacho  que ele cometeu  abusos. 

Ora, mas o advogado agiu em nome de direitos da pessoa que representa, agiu em nome de Bolsonaro. 

A má fé, alegada pelo ministro, exige intenção, excesso de atuação e com fim ilegal, exige o propósito de acreditar que seu objetivo é ilícito e não é o que o advogado defendeu junto a Gonçalves. Ele apenas pediu e insistiu. Insistir não é ofensivo. 

Se o ministro entendeu que termos foram expressos em desprestígio à Justiça, o recurso seria mandar deletá-los,  por não concordar com o pedido e tampouco com os termos. 

Aliás, se o ministro se excedeu, Simonetti, presidente da OAB, não pode se omitir. Precisa dar uma olhadinha na Lei 8.906 (o Estatuto da Advocacia): “Art. 70. O poder de punir disciplinarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração, salvo se a falta foi cometida perante o Conselho Federal”. Afinal, a OAB  é ou não  uma instituição republicana, imprescindível à Administração da Justiça, embora  a ela não se subordine?

Não pode um juiz, ainda que Ministro de Corte de Justiça Superior, impor providência que repercuta diretamente no exercício da atividade profissional, como a restrição imposta  por  Gonçalves ao fechar o sistema eleitoral para que o advogado não peticionasse mais.

Mesmo na suposição de ofensas ao ministro, cabia   procedimento  diverso: encaminhar ao Conselho de Ética da Ordem, e não agir como agente apurador da infração, julgador e aplicador da sanção disciplinar. Comportamento que infelizmente se tornou comum nos tribunais superiores. E que faz mal a democracia e á própria justiça. 

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Raimundo de Holanda é jornalista de Manaus. Passou pelo "O Jornal", "Jornal do Commercio", "A Notícia", "O Estado do Amazonas" e outros veículos de comunicação do Amazonas. Foi correspondente substituto do "Jornal do Brasil" em meados dos anos 80. Tem formação superior em Gestão Pública. Atualmente escreve a coluna Bastidores no Portal que leva seu nome.