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Polícia matou um inocente e Estado do Amazonas deve desculpas à família


Por Raimundo de Holanda

20/06/2021 19h53 — em
Bastidores da Política


  • Sérgio não era criminoso. Não estava em situação de flagrante delito. Não havia fundada suspeita que autorizasse a entrada, à força, de policiais em sua casa às 4 hs da manhã.
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A Operação "Coalizão pelo Bem" que prendeu integrantes do Comando Vermelho que promoveram uma onda de incêndios a ônibus e depredação de órgãos públicos em Manaus entre 5 e 8 deste mês, teve um planejamento. Sua execução, embora exitosa em grande parte, pecou  por um erro do Grupo Fera, que na suposição de que encontraria um dos suspeitos, invadiu uma casa na madrugada de sexta-feira e matou o motorista Sérgio Fragoso Monteiro.

Sérgio reagiu ? Provavelmente, sim. Ter a casa  invadida às 4 da madrugada é apavorante. O estado de  choque leva a reações perfeitamente justificáveis.   Primeiro, o impulso de proteger a família; segundo,  de preservar a inviolabilidade do lar, garantia Constitucional que não pode ser ignorada, nem mesmo em uma situação na qual o dono da casa não sabia se o agente invasor era bandido ou polícia.

E ainda na suposição de que soubesse ou tenha sido avisado que se tratava de uma operação policial, era absolutamente natural uma reação a um estado de violência intolerável. Não havia um crime em andamento na residência,  nem a possibilidade de um flagrante. Portanto, nada justificava a invasão ou sequer o cumprimento de um mandado judicial antes das 6 hs da manhã.

Sérgio era um motorista, homem comum, um trabalhador. Ninguém vai se debruçar sobre seu  túmulo e se redimir de  uma agressão cometida por agentes do Estado. Nem o Estado se vergará diante de uma verdade concreta: houve excesso da polícia. Mas o que preocupa a Secretaria de  Segurança não é como admitir um erro, e sim  o teor de uma nota explicativa, que deverá ser divulgada nesta segunda feira, porque até sábado não havia outra explicação  a não ser que o motorista havia reagido, isso depois de ser apontado erroneamente como um dos criminosos procurados.

O que constará na nota? Algumas inverdades, cenas montadas para encobrir um erro claro e inequívoco da  autoridade  policial.

Que a Defensoria Pública faça sua parte na defesa da família,  que deve ser indenizada. Que o Ministério Público do Amazonas exerça com rigor o controle da atividade policial e denuncie os excessos cometidos. Não é o melhor remédio, mas evitará a repetição de erro semelhante no futuro.

Nunca é demais lembrar recente decisão do Superior Tribunal de Justiça: policiais devem  ter a permissão do morador para ingressarem em casas que sejam suspeitas de abrigarem criminosos.

Por que a Polícia não divulga os videos ou áudios que tenha gravado na operação que vitimou Sérgio ?  Esse é  o procedimento recomendado pelo STJ.

E se reside dúvida sobre o fato de ali haver ou não  crime continuado, essa é daquelas que não pode ser interpretada a favor  do Estado ( Policial) e sim do cidadão.

Do contrário, todos estaremos sujeitos a essa violência, porque a Lei se aplica a todos, mas  a policia a interpreta em desfavor da sociedade, especialmente dos mais pobres.

Sérgio não era criminoso. Não estava em situação de flagrante delito. Não havia fundada suspeita que autorizasse a entrada, à força, de policiais em sua casa às 4 hs da manhã.

Então,  que fazer? O que dizer? Chorar com a família e rezar para que amanhã caso semelhante não se repita e nos encha de vergonha e dor.

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Raimundo de Holanda é jornalista de Manaus. Passou pelo "O Jornal", "Jornal do Commercio", "A Notícia", "O Estado do Amazonas" e outros veículos de comunicação do Amazonas. Foi correspondente substituto do "Jornal do Brasil" em meados dos anos 80. Tem formação superior em Gestão Pública. Atualmente escreve a coluna Bastidores no Portal que leva seu nome.