Número de barrados em Portugal neste ano preocupa Itamaraty
LISBOA - A cabeleireira brasileira Michele Silva, de 32 anos, chegou a pensar em separação depois de ter sido impedida de entrar em Portugal em março. “Meu marido estava desempregado no Brasil, viajou como turista no fim do ano passado e em uma semana conseguiu trabalho na região de Lisboa”, conta. Quando ela foi fazer o mesmo caminho, cinco meses depois, acabou barrada. “Foi um trauma. Na hora tive crise alérgica, chorei a noite toda.”
A pressão migratória que levou o consulado de Portugal em São Paulo a suspender o recebimento de novos pedidos de cidadania também se vê no aumento “significativo” de casos como o de Michele registrados pelo Itamaraty nos primeiros meses de 2018. Nesta sexta-feira, 26, o Ministério das Relações Exteriores confirmou, em nota, que “o crescimento (de recusados) nos primeiros meses de 2018 foi bastante significativo e o Consulado-Geral do Brasil em Lisboa tem transmitido às autoridades portuguesas a preocupação do governo brasileiro quanto ao aumento no número de casos”.
O ministério lembra que é direito de todo viajante barrado contatar o seu consulado. No caso de Portugal, há consulados em Lisboa, Porto e Faro. O órgão informou ainda que o Consulado-Geral de Lisboa mantém “diálogo constante com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) de Portugal, com vistas a zelar pelo bem-estar dos turistas, e realiza visitas às instalações destinadas aos inadmitidos”.
Segundo dados levantados pelo jornal português Expresso, até o fim de agosto, 2.209 pessoas foram impedidas de entrar em território português no aeroporto internacional de Lisboa, um aumento de 74% em comparação ao mesmo período de 2017. Desses, 1.655 eram brasileiros. Em média, 6 brasileiros são mandados de volta por dia.
Motivos
As duas causas principais de recusa - não é deportação porque a pessoa nem chega oficialmente a entrar no país europeu - são a ausência de um visto válido/adequado e a falta de comprovação da condição de turista. Para comprovar que se é turista, é necessário apresentar passagem de ida e de volta, local de alojamento e dinheiro para se manter durante o período de visita.
No caso de Michele, ela não conseguiu convencer o oficial da imigração portuguesa de que estava a turismo. Mas conseguiu se reencontrar com o marido há três meses em Portugal - na segunda tentativa.
Já Valesca Nunes, de 41 anos, agradeceu por ter ficado apenas uma noite até ser “devolvida” ao Brasil, quando ela e o marido voltavam para Portugal em janeiro. “Já fiz trabalhos em presídio e posso lhe garantir que é bem parecido”, afirma.
Ela, o marido e dois filhos do casal moravam havia um ano em Portugal quando o filho do meio, de 21 anos, morreu em um acidente no Brasil. O casal viajou para o enterro e não pôde voltar ao local que chama de casa. “Na hora nem pensamos que isso poderia acontecer. Meu marido tinha contrato de trabalho, registro no departamento de finanças, pagava todos os impostos, mas não tinha conseguido agendar a entrevista para autorização de residência.”
Valesca foi impedida de entrar por falta de visto. “Minha vida, meus filhos estavam em Portugal, o mais novo tinha só 17 anos. Perguntei ao oficial que me barrou o que deveria fazer, e ele me disse que deveria procurar o consulado no Brasil e pedir o visto. Meus filhos estavam do outro lado do portão e não pude vê-los, abraçá-los”, relembra. Acabaram entrando como turistas, via Espanha.
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