Grafite no Rio: o futebol como herói e vilão
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No Rio de Janeiro, a Copa do Mundo é disputada também nos muros e paredes da cidade, com latas de spray e desenhos feitos por artistas de rua que homenageiam o Mundial, enquanto outros usam essa manifestação para criticar o evento.
De um lado, há um desenho de Ronaldo e seu famoso corte de cabelo "cascão" comemorando os dois gols marcados na final da Copa de 2002 em uma parede do bairro de Laranjeiras. Em outra obra, a primeira seleção brasileira a conquistar o título da Copa do Mundo, na Suécia em 1958, aparece triunfante numa colina de Santa Tereza.
Do outro, o mascote do Mundial-2014 estupra a justiça brasileira, uma morena nua com olhos vendados, perto do Maracanã. Sobre o tatu Fuleco, a pergunta: "Quantas famílias são despejadas em uma Copa do Mundo?". No muro ao lado, o mascote fuma crack e, em sua camiseta, está escrito: "Depois da Copa..."
Outra parede perto do Maracanã homenageia algumas glórias da seleção, de Zagallo a Romário, passando por Pelé, o "Rei do futebol".
- Coquetel Molotov -
Em Botafogo, dezenas de latas de spray são vistas amontoadas sobre uma calçada. Com os rostos cobertos, dois grafiteiros se prepararam para desenhar na fachada de uma universidade. Em frente à mensagem "Copa?" aparece uma figura sinistra com um coquetel Molotov na mão.
"Não colocamos um coquetel Molotov para incitar a violência, mas porque é um símbolo, para incitar o protesto", explica à AFP o artista conhecido como "Fiuz". "Está tudo errado com esta Copa do Mundo, com as obras, o superfaturamento, a corrupção", denuncia.
"As pessoas falam de festa popular, mas, na verdade, a Copa serve apenas à burguesia", acrescenta seu parceiro, "Peq1". "Somos contra a Copa do Mundo, porque a Fifa veio impor suas normas ao Brasil, que carece de serviços públicos dignos. As pessoas morrem nos hospitais e a educação é uma piada!".
Esses dois estudantes de design retomam assim os temas das manifestações anti-Copa, que seguiram, em escala muito menor, os grandes movimentos de junho do ano passado durante a Copa das Confederações no Brasil, contra os investimentos públicos em estádios e por melhores serviços públicos.
"Fiuz" e "Peq1" são representantes de um movimento anarquista ou de uma extrema esquerda popular no meio 'undergroud' dos grafiteiros.
- Pichações e traição -
Outros, como Jambeiro, preferem passar a mesma mensagem de maneira um pouco mais sutil. Este artista de 44 anos trabalhará para uma televisão estrangeira durante o Mundial, mas vive de seu pincel e prefere exaltar o Rio, o Carnaval e o futebol em seus quadros. "Mas prefiro pintar em paredes porque posso me expressar melhor, fico menos limitado", explica à AFP.
Uma ruela da Lapa serve de galeria para várias obras do artista, como uma lembrança de junho de 2013, com um Maracanã cercado por manifestantes usando a camisa da seleção e mostrando cartazes com reivindicações. Na pintura, Neymar se prepara para chutar uma bola em forma da cabeça de... Sepp Blatter, o presidente da Fifa.
"Eu não sou contra a Copa do Mundo, pelo contrário, mas participei das manifestações, e esta é minha maneira de dizer que queremos futebol, mas também saúde e educação", declara Jambeiro, que faz questão de se diferenciar dos pichadores e dos "rebeldes que sempre se opõem a tudo".
"Não vejo motivo para comemorar a Copa do Mundo este ano", considera "Peq1". "Para mim, isto seria trair o ideal revolucionário que nasceu no Brasil em 2013", referindo-se à onda de manifestações contra os gastos com a Copa, contra os serviços públicos precários e a corrupção.
A pouco mais de um mês da Copa, protestos e comemorações dependem de que lado do muro você está.

ASSUNTOS: Coluna 2, Esportes