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Câmara aprova mudanças no Carf em vitória para Haddad

Por Folha de São Paulo

07/07/2023 19h00 — em
Economia



BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A Câmara dos Deputados aprovou nesta sexta-feira (7) o projeto de lei que muda regras de funcionamento do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fazendários), tribunal administrativo que julga disputas bilionárias entre União e contribuintes sobre o pagamento de impostos. c.

O resultado, aprovado simbolicamente, representa uma vitória parcial do ministro Fernando Haddad (Fazenda) –que, após resistências duras do Congresso, teve que negociar um meio-termo e até transformar a MP (medida provisória) em projeto de lei para ver o texto avançar.

O projeto é um dos principais itens do pacote de ajuste fiscal apresentado por Haddad em janeiro para tentar reequilibrar as contas públicas, que vão retornar ao terreno negativo em 2023 após a expansão de despesas articulada durante a transição de governo. O ministro também precisa do texto para gerar receitas de forma a buscar compensar o crescimento de gastos gerado pelo novo arcabouço fiscal nos próximos anos.

A Fazenda estima que a perda do voto de qualidade gerou uma perda de R$ 59 bilhões para a arrecadação pública. Uma reintrodução do mecanismo representaria, portanto, uma parcela significativa dos R$ 150 bilhões que o governo precisa para zerar o déficit primário do ano que vem. Não há até o momento nova estimativa da Fazenda após as mudanças no projeto.

A aprovação do texto do Carf veio após uma intensa negociação do Ministério da Fazenda com a Câmara, que a princípio tinha fortes resistências às modificações. O próprio Haddad dialogou diretamente com o setor privado, com congressistas, com o relator da matéria, deputado Beto Pereira (PSDB-MS), e com o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), para negociar a matéria e tornar o texto menos rigoroso para os contribuintes.

O plano inicial era votar o texto na segunda-feira (3), mas as dificuldades para aprovar a Reforma Tributária, que acabou aprovada somente na madrugada de hoje, jogaram a análise do projeto que altera as regras do Carf para o último dia de sessão do Congresso antes do recesso branco. Chegou a ser cogitada a votação do projeto somente em agosto.

A principal mudança no texto, que agora precisa ser aprovada pelo Senado, envolve o chamado voto de qualidade. O projeto aprovado prevê condicionantes para a volta do mecanismo –que determina que, em caso de empate nas votações do tribunal, cabe ao presidente do colegiado (indicado pelo Ministério da Fazenda) o poder de decisão sobre o caso.

O relator da matéria usou como base o acordo feito em fevereiro entre Fazenda, Abrasca (Associação Brasileira das Companhias Abertas) e OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) livrando contribuintes de multas e com descontos nos juros em caso de empate no julgamento do Carf.

O voto de qualidade foi derrubado em 2020 pelo Congresso, ampliando as perdas da União no tribunal —que já servia como instrumento de manobra de grandes empresas para adiar por anos o recolhimento de tributos.

O texto final retirou um ponto que causou divergência até mesmo dentro do Poder Executivo, a previsão de conceder alívio em multas e juros até para devedores que tinha condições de pagar os débitos. O trecho não estava no projeto enviado pelo governo e só foi incluída no texto por Pereira, mas foi retirada após negociação do governo federal.

A medida abriria caminho para uma ampliação significativa da chamada transação tributária, cuja lei foi sancionada em 2020 para ser aplicada à negociação de débitos irrecuperáveis ou de difícil recuperação.

Outra mudança envolveu o valor mínimo em disputa para que o contribuinte possa recorrer ao Carf. O piso é hoje de 60 salários mínimos (R$ 79,2 mil) e o projeto de Haddad subiria esse limite para mil salários mínimos (R$ 1,32 milhão) —ou seja, dificultando o acesso ao Conselho. O relator, no entanto, rejeitou a mudança proposta por Haddad e seguiu a regra atual (60 salários mínimos).

A avaliação majoritária da Câmara é a de que a mudança proposta pela Fazenda limitava a capacidade de contribuintes de questionarem as infrações lançadas pela Receita Federal.

A Casa também reviu a chamada "classificação de conformidade", iniciativa incluída no projeto e que autoriza a Receita a deixar de punir contribuintes que tenham uma espécie de selo de bom pagador de tributos caso eles deixem de cumprir momentaneamente alguma obrigação ao Fisco.

A ideia do governo é que o conceito de conformidade seja baseado em critérios como regularidade do cadastro e do recolhimento dos tributos, exatidão das informações prestadas, entre outros itens definidos pela Receita.

O relator do projeto mudou a redação e estabeleceu que a classificação considerará também a compatibilidade de escriturações e declarações e outros critérios a serem definidos pela Receita Federal. Seu objetivo era especificar mais o que define quem é um bom pagador.

A aprovação do Carf passou também por um acordo com a FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), um dos principais grupos da Câmara, e que inicialmente se posicionou contra o texto.

A base do governo acatou três pedidos feitos pela FPA, um dispositivo para renegociação de dívidas de cooperativas do agro, outro que beneficiou o setor de sementes e um terceiro para impedir a liquidação antecipada das garantias.

Inicialmente, o texto havia sido enviado ao Legislativo como uma MP, mas diante da contrariedade de Lira com o rito da tramitação desse tipo de texto e sob risco de perda de validade, a matéria foi transformada em um projeto de lei com regime de urgência.

Até maio deste ano, o Carf julgou 5.578 casos dos quais 264 terminaram empatados e que necessitaram do voto de qualidade, segundo o Ministério da Fazenda. Os casos que usaram o mecanismo têm um valor somado de R$ 24,8 bilhões.

À tarde, os parlamentares aprovaram em votação simbólica (sem a contagem de votos) o projeto que recria o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que tem como prioridade o fomento da produção familiar. O texto seguirá ao Senado.

O projeto estabelece que ao menos 30% de todo o recurso reservado para a compra de alimentos por órgãos, empresas públicas e entidades da administração pública deverão ser destinados à aquisição de produtos de agricultores familiares.

Com relatoria do deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP), a matéria também prevê a instituição do programa cozinha solidária, que oferece refeições gratuitas à população em situação de vulnerabilidade. Caberá ao Ministério do Desenvolvimento Social organizar e estruturar o programa.


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