Após tentativa de golpe, governo turco controla todos os jornais do país
SÃO PAULO - A tentativa de golpe militar fracassada na Turquia na semana passada gerou uma forte repressão a liberdade de imprensa. De acordo com o jornalista Kamil Ergin, o último jornal independente foi fechado pelo governo do presidente Recep Erdogan na quarta-feira e os jornalistas foram presos e tiveram suas credenciais canceladas.
- Hoje, infelizmente, podemos dizer que não há mais uma fonte de informação local que podemos de alguma forma confiar, porque são todos controlados pelo governo - contou ele em coletiva no Centro Cultural Brasil-Turquia, em São Paulo.
O presidente da entidade, que é inspirada no Hizment, Mustafa Goktepe, disse ver a decretação do estado de emergência no país como fim da democracia e que, caso haja o fim das negociações com a União Europeia e da aliança com a OTAN, o país corre o risco de viver isolado.
- Se for assim, a Turquia realmente vai ser um país isoladíssimo, em que Erdogan e seus simpatizantes vivem em paz e o resto vive em um exílio.
Ergin contou que o governo está promovendo uma verdadeira caça às bruxas, estabelecendo uma linha telefônica para que a população denuncie, em troca de recompensas, simpatizantes do movimento Hizment, liderado pelo clérigo Fethullah Gulen, além de divulgar o nome de empresas que o apoiam para incentivar saques.
O jornalista listou uma série de acontecimentos considerados “estranhos” na sexta-feira como, por exemplo, o fato de os golpistas não terem prendido imediatamente os membros do governo e controlado todos os meios de comunicação. Ele também chamou a atenção para o fato de que Erdogan ter dito que a tentativa de golpe era um "presente de Deus" para que o governo pudesse promover uma limpeza geral. O presidente da entidade afirmou, no entanto, não acreditar na hipótese de autogolpe, embora esteja certo de que o governo estava ciente do movimento.
- Não diria que ele armou esse golpe, porém tudo indica que tinha conhecimento disso por ter total controle da polícia. É impossível ele não ter conhecimento disso. Portanto, ele sabia que não ia dar certo e que sairia fortalecido dessa - disse Goktepe.
Segundo estimativa feita por Ergin, o número de pessoas expurgadas após a fracassada tentativa de golpe deve ultrapassar 2 milhões. Para ele, ao declarar estado de emergência por três meses, Erdogan vai promover uma "limpeza ainda maior" de pessoas supostamente ligadas ao Hizment.
- Três mil militares foram presos em cerca de duas horas e isso me faz questionar se já não havia uma lista, porque não é possível em tão pouco tempo identificar tantas pessoas. Até agora, são 58 mil pessoas entre funcionários públicos, juízes, reitores de universidades e até o ministro do Esporte, mas ainda estamos no começo. Estou prevendo que essa lista vai chegar a dois milhões.
Para eles, no entanto, a sociedade turca que já sofreu com quatro golpes, está sensível o suficiente para entender que a democracia é o melhor caminho.
- As pessoas sabem o que isso significa (um golpe), por isso, a primeira reação do povo foi atender o convite do Erdogan e ir às ruas defender a democracia - completou Ergin.
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