Mauro Vieira defende integração da América Latina contra protecionismo em cúpula da Celac
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TEGUCIGALPA, HONDURAS (FOLHAPRESS) - O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, usou a cúpula da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos) em Honduras para defender o fortalecimento do grupo diante do "refluxo do unilateralismo e do protecionismo".

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A fala ocorreu nesta terça-feira (8), durante encontro a portas fechadas dos chanceleres da entidade. O evento antecipa o ponto alto da cúpula -a reunião dos chefes de Estado, na qual o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai discursar nesta quarta (9).
"Diante das transformações por que passa o sistema internacional, marcado, atualmente, por crescentes tensões geopolíticas e pelo refluxo do unilateralismo e do protecionismo, a Celac deve fortalecer-se, de modo a permitir que continuemos, de forma unida e firme, a atuar em temas que são caros para a região", afirmou o chanceler brasileiro a seus homólogos, de acordo com a sua equipe
"Aproveito para destacar a relevância de alguns pontos que requerem nossa atenção especial, como nosso relacionamento externo com países terceiros e blocos", continuou. "No presente cenário global, é essencial que tenhamos maior coordenação prévia intra-Celac para subsidiar tais contatos, sobretudo com a China e União Europeia, com quem devemos ter reuniões no presente ano."
O discurso ocorre quase uma semana após o anúncio do que ficou conhecido como o tarifaço do presidente americano, Donald Trump. Na quarta-feira passada (2), o republicano assinou um decreto impondo taxas sobre produtos de países aliados e adversários na tentativa de reindustrializar os Estados Unidos.
O impacto na América Latina, de certo modo, foi controlado -a maior parte da região, incluindo o Brasil, recebeu a tarifa mínima de 10% estabelecida por Washington. As exceções são Venezuela e Nicarágua, taxados em 15% e 18%, respectivamente, e México, já parcialmente taxado em relação a alguns produtos, mas poupado da última rodada.
O cenário global que nasce da política externa do republicano apareceu indiretamente no discurso de Vieira, embora o chanceler não tenha citado nominalmente Trump.
"Vemos positivamente a proposta chinesa de realização do 4º Fórum Celac-China em Pequim, no marco dos dez anos de sua instituição", disse o ministro. "Entendemos que se trata de uma reunião estratégica, em um momento político especialmente relevante para demonstrar a importância de uma agenda de cooperação econômica e de investimentos para a região."
Apesar da pertinência do tema, as tarifas não devem dominar os trabalhos da cúpula. A reação ao anúncio, segundo funcionários do Itamaraty muito recente para ser incluído nas pautas das reuniões, seria uma jogada arriscada para diversos países da região, em grande parte dependente dos EUA.
Justamente por essas razões o assunto deve ficar restrito à reunião dos chanceleres e às falas de chefes de Estado, sem aparecer na declaração final da cúpula. O documento, negociado há semanas pelas partes envolvidas, depende do consenso de todos os países -um desafio para uma região tão heterogênea e que se fragmentou politicamente nos últimos anos.
Mesmo nesse cenário, o Brasil tenta reunir o grupo em torno de uma pauta: lançar a candidatura de uma mulher da América Latina para concorrer à Secretaria-Geral da ONU, no lugar do português António Guterres.
"Temos uma longa trajetória de contribuição ao multilateralismo e ao fortalecimento das Nações Unidas. A seleção do próximo secretário-geral da ONU constitui oportunidade singular para refletir essa participação na liderança da Organização. Chegou o momento de a região ocupar novamente esse cargo, após mais de três décadas", disse Vieira, em referência ao peruano Javier Pérez de Cuéllar, último latino-americano a chefiar a organização, entre 1982 e 1991.
"Por isso, é fundamental que a Celac defenda um processo de seleção transparente, baseado no mérito, que leve em conta a expectativa legítima de maior equilíbrio regional. Consideramos, além disso, que a agregação da perspectiva de gênero fortalecerá nossa candidatura", afirmou.
Com a proposta, o Brasil corre o risco de repetir a cúpula do G20 do Rio de Janeiro, realizada em novembro do ano passado. Na ocasião, a delegação da Argentina, governada pelo ultraliberal Javier Milei, inicialmente se opôs à inclusão de um trecho sobre igualdade de gênero e combate a violência sexual -que, ao final, acabou incluído após recuo de Buenos Aires.

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