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Ursula von der Leyen precisa controlar dissidências para se reeleger presidente da Comissão Europeia

Por Folha de São Paulo

17/07/2024 23h30 — em
Mundo



LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) - A matemática está a favor da recondução de Ursula von der Leyen à presidência da Comissão Europeia. Ela foi indicada pelo Conselho Europeu, a instância que reúne os chefes de Estado da União Europeia, para um segundo mandato de cinco anos, e necessita da confirmação do Parlamento Europeu.

Parece fácil: ela precisa de 361 votos, metade mais uma das 720 cadeiras. Ao mesmo tempo, somente a aliança de centro que a apoia desde a legislatura anterior reúne 405 deputados.

Os partidos do Parlamento Europeu agregam siglas nacionais com ideias semelhantes. A alemã Von der Leyen pertence ao Partido Popular Europeu (EPP), de centro-direita. Ela governou em seu primeiro mandato com o apoio dos Socialistas e Democratas (S&D), de centro-esquerda, e com o Renovar a Europa (Renew), de centro -além de contar com o apoio dos Verdes em questões pontuais.

Política, no entanto, não é matemática. As principais dúvidas sobre a reeleição de Von der Leyen estão dentro do próprio EPP, que está dividido. Como o voto é secreto, os infiéis não são punidos. A sigla vive o grande dilema da direita europeia. Não sabe se deve se aproximar da esquerda -no movimento conhecido como "cordão sanitário", contra os extremos do espectro político- ou da ultradireita.

A política europeia atual se divide em três blocos: esquerda, direita e ultradireita (a esquerda radical não é expressiva em quase nenhum país). Nesse cenário tripartido, a direita ficou no meio. Na Holanda, aliou-se à ultradireita. Em Portugal e na Alemanha, aproximou-se da esquerda para formar governo. Na França, as três forças aparentemente chegaram a um impasse -mas no segundo turno das eleições legislativas a coligação de esquerda e o macronismo se juntaram para barrar a ultradireita de Marine Le Pen.

Logo após as eleições parlamentares, o Partido Popular ensaiou uma aproximação com os Conservadores e Reformistas Europeus (ECR), ala da ultradireita chefiada pela primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni.

O principal ponto de divisão dentro do Partido Popular é o Pacto Ecológico Europeu, uma das marcas do primeiro mandato de Von der Leyen.

Muitos dos deputados eleitos pelo partido, em diversos países, são próximos aos agricultores, que julgam pagar a conta da transição energética. Pelo Pacto Ecológico Europeu, eles precisam seguir regras rígidas de sustentabilidade, que às vezes envolvem gastos, e eventualmente competir com produtos importados que não seguem as mesmas normas.

Esses agricultores reivindicam uma revisão no Pacto Ecológico Europeu. Fizeram passeatas e tratoradas ao longo do mês de maio, às vésperas das eleições. Muitos políticos da direita tradicional são receptivos a esses apelos. Os republicanos franceses, por exemplo -que integram o Partido Popular Europeu- têm grande parte de suas bases na zona rural do país.

"Vamos colocar a esquerda na oposição", disse Meloni logo depois das eleições do início de junho.

"Os partidos do ECR formam governos de fato e seus apoios podem ser essenciais para aprovar leis importantes", disse na mesma época o porta-voz do Partido Popular, Pedro López de Pablo, em entrevista ao canal Deutsche Welle. "Os Verdes não são confiáveis, e o ECR não é mais percebido como ultradireita", afirmou, refletindo o pensamento da ala mais conservadora de seu partido.

López de Pablo, no entanto, estava errado. Para o grupo de esquerda Socialistas e Democratas, o ECR é, sim, de ultradireita -e qualquer apoio formal de Meloni a Von der Leyen implicaria na retirada do S&D da coligação de centro.

O grupo de Meloni tem 84 cadeiras no Parlamento. Os Socialistas e Democratas elegeram muito mais deputados -136. Os Verdes e os Liberais também ameaçaram retirar seu apoio caso houvesse qualquer tipo de acordo com o grupo de Meloni.

A sessão do Parlamento Europeu desta quarta-feira (17), véspera da eleição, sinalizou a manutenção do "cordão sanitário". Todos os partidos da aliança de centro, incluindo os Verdes, votaram unidos na primeira questão debatida pela nova legislatura -o apoio incondicional à Ucrânia na guerra contra a Rússia. Foram 495 votos a favor, 137 contra e 47 abstenções.

Na direção oposta, dois dos três grupos da ultradireita votaram por uma postura negociadora com Vladimir Putin -incluindo o Patriotas pela Europa, liderado pelo premiê húngaro, Viktor Orbán.

Ursula von der Leyen decretou um boicote à Hungria, que ocupa a presidência rotativa da União Europeia -em mais um sinal de que manterá o "cordão sanitário". Já o grupo de Meloni se posicionou a favor da Ucrânia -a primeira-ministra italiana pretende transformar o apoio informal em cargos na burocracia da União Europeia.

Trata-se de uma votação de tiro único. Se Von der Leyen não conseguir os 361 votos, o Conselho Europeu terá de recomeçar do zero o processo de escolha e apontar outro nome.

Nas conversas que manteve ao longo da quarta, Von der Leyen teve a difícil tarefa de sinalizar aos Verdes que manterá o Pacto Ecológico Europeu e ao mesmo tempo acalmar a ala de seu partido que defende os agricultores.

O resultado da votação dirá se foi bem-sucedida -e se a União Europeia seguirá no caminho verde e digital, um dos slogans de Von der Leyen em seu primeiro mandato.


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