Juiz autoriza mais uma união civil de gays no Amazonas
Duas conversões de união estável homoafetiva em casamento civil foram autorizadas esta semana pelo juiz Dídimo Santana Barros Filho, que responde pela Vara de Registros Públicos e Precatórias da Comarca de Manaus, do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM). Não se trata de uma decisão inédita, porém, é incomum na Justiça amazonense. A partir de agora, os cônjuges passam a ter assegurados os direitos e deveres relativos ao casamento.
Um dos casos é o de duas mulheres que mantêm registro de união estável há três anos; outro é de dois homens, que vivem juntos desde 2000. Ambos os processos de conversão foram iniciados em 25 de setembro deste ano e cumpriram as exigências legais para a habilitação ao casamento, com apresentação de documentos e publicação de editais. O Ministério Público opinou favoravelmente ao pedido.
Uma das partes do processo, a advogada Mônica Cristina Pereira de Godoy, diz que vão fazer uma cerimônia de comemoração. “Ficamos muito contentes, felizes com a decisão do juiz. Ele foi brilhante na sua decisão e compreensão de que o mundo evoluiu e até nos felicita pela nossa união”. Mônica é presidente da Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Amazonas e avalia que esta é uma vitória para a OAB e para o Estado do Amazonas e que a entidade vem tentando fazer com que o segmento LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e travestis) tenha os mesmos direitos dos casais homossexuais, além dos deveres. “Estamos tentando fazer com que os cartórios processem os casamentos sem intervenção judicial. A batalha da comissão tem sido no sentido de que isso aconteça”.
O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a união estável e a extensão de seus efeitos a casais homoafetivos; já a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou, pela primeira vez no Brasil, o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Conforme trecho do parecer do MP, “ainda que esta decisão (do STJ) não tenha efeito vinculante para todo o país, trata-se de jurisprudência importante para análise de casos semelhantes”.
O juiz Dídimo Santana Barros Filho ressalta que “tem muita gente em situação semelhante e fica constrangida. As pessoas não sabem que já é possível formalizar união estável, na esteira de decisão do STF, ou avançar para o casamento, como decidiu o STJ”.
Veja abaixo a sentença do magistrado:
“Encaminhamento, pelo cartório do 8º Ofício do Registro Civil, de habilitação matrimonial, onde consta requerimento de conversão de união estável homoafetiva em casamento.
O Ministério Público, na atuação sempre lúcida da promotora de justiça, lançou parecer pelo deferimento do pedido.
No essencial o relatório.
Em outros tempos, esse tema talvez causasse um certo estranhamento, fruto, certamente, de incompreensões, intolerância e tantos outros sentimentos próprios do ser humano; nem bons ou ruins, apenas humanos. Mas a vida evolui, o ser humano evolui, a sociedade evolui, os valores evoluem, o mundo jurídico e sua interpretação humanística evoluem; o que é natural, diante de tantas situações e acontecimentos de agressão ao ser humano, que fazem brotar em cada um, na sociedade e nas instituições a necessidade de sua preservação, possibilitando condições de uma existência digna, com chances reais de felicidade.
Essa evolução, tenha-se por certo, se deu, também, no enfrentamento jurídico da união estável e consequente casamento entre pessoas do mesmo sexo, a denominada relação ou convivência homoafetiva.
Revolvendo e dissecando princípios/direitos fundamentais e valores morais seculares, o STF debateu e julgou o tema da união estável homoafetiva, concluindo pela seu reconhecimento e legitimidade da proteção jurídica. Ressalvando alguns descontentamentos de cunho religioso ou de moral ancestral rígida, a decisão foi bem acolhida pela sociedade. E nem poderia ser diferente. Os tempos são outros, interessando mais o bem estar e a dignidade do ser humano.
Não muito tempo depois o STJ, na esteira do julgamento do STF, reconheceu a possibilidade de casamento entre pessoas do mesmo sexo. Mais um avanço formidável. E nem poderia ser diferente. Se o STF reconheceu juridicamente a união estável homoafetiva, não faria o menor sentido que esta não pudesse avançar para o casamento, diante do disposto no § 3º, do art. 226, da Constituição Federal, e art. 1.726, do Código Civil. Seria, tal não fosse possível, um avanço pela metade, um meio-direito.
E justamente por isso é que o pedido formulado merece resposta judicial favorável.
Quanto à habilitação, tem-se por regular, com os documentos necessários e etapas procedimentais de estilo. Inclusive, em relação àqueles, com declaração, mediante escritura pública, de união estável, da qual consta opção pelo regime de casamento.
Diante dessas considerações, tem-se por deferida a conversão da união estável das requerentes em casamento, nos termos formulados, com dispensa de celebração oficial, solene, sem prejuízo, evidentemente, de cerimônia festiva de celebração, sempre bonita e emocionante, que congrega parentes, amigos e que marca momento importante da vida das pessoas.
Que as requerentes sejam felizes!
Expeça-se o mandado, para as providências registrais necessárias.
Sem custas.
Intime-se.
Arquive-se.”
ASSUNTOS: casal gay, uniao homoafetiva, Manaus