Semana Santa, calvário e êxodo nas águas?
Em plena Semana Santa começou a operação para a retirada de construções flutuantes do igarapé Tarumã-Açu (zona oeste de Manaus), em obediência a ordens judiciais que tiveram início ainda em 2023 e, por conta de contestações, vinham sendo adiadas. Na última terça-feira 26, a notícia estava em todos os veículos de comunicação: a retirada começava pelos flutuantes abandonados, que seriam 18 ou 20. Dois dias depois, já se podia ler que seis flutuantes haviam sido retirados, com ajuda de órgãos municipais, estaduais e federais e a tarefa poderia ser cumprida em três ou cinco dias. De acordo com informações da secretaria municipal do meio ambiente, em junho de 2023, foram identificados 900 flutuantes na orla do Tarumã-Açu que seriam removidos: 660 eram destinados ao lazer, recreação e comércio, enquanto 190 serviam de moradia.
Seguindo a ordem de retirada, começando pelos flutuantes abandonados, o calvário e o êxodo dos que desde há muito tempo moram e ganham a vida sobre as águas do Tarumã-Açu estão às portas. Até onde foi possível buscar informações, o número de moradores das casas flutuantes é desconhecido. Igualmente desconhecido é o destino deles depois da operação final. Dadas as circunstâncias e a realidade, ninguém ficará 40 anos no deserto procurando a terra prometida e os possíveis transtornos serão superados. E para os que não têm nada com isso, é mais um episódio a ser facilmente esquecido. De concreto há o fato de que “moradores das águas” terão de migrar para algum lugar e a mídia ainda não reservou espaço para essa parte da história. Todo o resto é conhecido: os motivos para a retirada, as idas e vindas de ordens/suspensões judiciais, imagens (muitas bem coloridas) do que é quase uma ilha flutuante em águas plácidas.
Sobre a indagação do que seria feito com o material das construções flutuantes, já existe uma resposta, divulgada na imprensa: será usado em obras públicas. Foi o que afirmou Antônio Stroski, titular da SEMMAS (Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Sustentabilidade de Mudança do Clima), quando do início da retirada de flutuantes abandonados. “Em mais ou menos três a cinco dias de operação a gente atende esses flutuantes que estão em situação de abandono. Mas a gente também pensou na destinação dos materiais recolhidos. Aquilo que for possível aproveitamento, a gente vai direcionar, seja para obras públicas, ações e intervenções que serão feitas pela prefeitura”, disse o secretário, conforme publicado no Portal do Generoso. Outra explicação: a retirada de todo o material não deixará “qualquer resíduo no espelho d´água”.
Não fica claro, no entanto, se o material dos demais flutuantes terá o mesmo fim daqueles que estavam abandonados. De qualquer forma, a decisão faz lembrar Lavoisier, considerado o pai da química: “Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. A vida dos seres humanos igualmente se transforma, também por circunstâncias. E sobre esse assunto, a coluna já fez sugestões à Redação deste portal, sem qualquer êxito até agora. Na última, com o título “Quando casas e opiniões flutuantes se encontram”, publicada em 19 de março, um novo apelo. “Portal do Holanda: abrir um espaço para saber um pouco da história dessas pessoas que serão rebocadas sabe-se lá para onde, será um registro para a História do Amazonas. Que tal uma visita às casas sobre águas”?
Mas, ainda dá tempo. Ainda faltam algumas “estações” na caminhada rumo ao final.
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