Ainda estamos aqui, ao contrário do que planejavam os golpistas, diz Lula em ato sobre 8/1
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente Lula (PT) lembrou nesta quarta-feira (8) as investigações sobre a trama golpista de 2022 e o filme "Ainda Estou Aqui" ao falar em cerimônia que marca os dois anos dos ataques golpistas de 8 de janeiro.
"Ainda estamos aqui, ao contrário do que planejavam os golpistas", declarou.
Com mais de 3 milhões de espectadores, "Ainda Estou Aqui", de Walter Salles, retrata a história da família de Rubens Paiva, sequestrado e assassinado pela ditadura militar. No último domingo, a atriz Fernanda Torres ganhou o prêmio de melhor atriz em filme de drama no Globo de Ouro pela interpretação da viúva, Eunice Paiva.
Já o 8 de janeiro ficou marcado com um dos maiores ataques à democracia, com depredações nas sedes dos três poderes levadas a cabo por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O STF (Supremo Tribunal Federal) condenou até o momento 375 réus pelos atos, que resultaram na denúncia de 1.682 envolvidos.
"Hoje é dia de dizer, em alto e bom som, ainda estamos aqui. Estamos aqui para dizer que estamos vivos, que democracia está viva, ao contrário do que planejavam os golpistas de 8 janeiro de 2023", disse Lula.
"Estamos aqui, mulheres e homens de diferentes origens, crenças, partidos e ideologias, unidos por uma causa em comum. Estamos aqui para dizer alto e bom som ditadura nunca mais, democracia sempre. Estamos aqui para lembrar que, se estamos aqui, é porque a democracia venceu", completou o presidente, sob aplausos.
Em outro momento de seu discurso, o presidente voltou a defender punição aos responsáveis pelos ataques golpistas.
"Os responsáveis pelo 8 de janeiro estão investigados e punidos. Ninguém foi ou será preso injustamente. Todos pagarão pelos crimes que cometeram, todos", disse.
"Inclusive os que planejaram o assassinato do presidente e do vice-presidente da República e do presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Terão amplo direito de defesa e terão direito à presunção de inocência", completou.
Segundo a Polícia Federal, o plano articulado em 2022 para evitar a posse de Lula previa o assassinato do petista, do vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB), e do ministro Alexandre de Moraes, então presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Lula tem dito que quer fazer de 2025 um ano de defesa da democracia. A fala foi feita a portas fechadas diversas vezes, mas também em telefonema a Fernanda Torres recentemente, quando a procurou para parabenizá-la pelo Globo de Ouro.
Na ligação, ele também relacionou a oposição liderada por Bolsonaro à ditadura militar.
Na cerimônia desta quarta, Lula evitou o termo "militares legalistas", que havia causado ruído na caserna no ano passado, e fez agradecimento nominal ao ministro da Defesa, José Mucio, e aos comandantes das Forças Armadas.
"Eu quero agradecer ao Mucio, que trouxe os três comandantes das Forças Armadas para mostrar a esse país que é possível a gente construir as Forças Armadas com a proposta de defender a soberania nacional", disse.
Depois da cerimônia, Múcio disse que espera o fim das apurações da Polícia Federal sobre a suposta tentativa de golpe em 2022 para punir culpados e, por outro lado, eliminar suspeitas sobre inocentes.
Coube a Moraes, mais tarde, em ato menor do STF, a crítica à omissão do Exército em relação aos acampamentos golpistas diante de seus quartéis há dois anos.
"Houve inércia, houve omissão de se deixar acampamentos serem montados à frente dos quartéis pedindo intervenção, pedindo golpe. Isso é crime. E hoje ninguém mais pode dizer que não sabe disso, são crimes de incitação, de organização criminosa por estarem à frente dos quartéis", disse o ministro.
Aplaudido e saudado aos gritos de "Xandão" ao ser anunciado no ato no Planalto, Moraes foi alvo de brincadeira de Lula no evento na sede do Executivo.
O presidente disse que nenhum outro ministro do STF havia tido um apelido "do povo" como o dele. "Desse apelido você nunca mais vai se libertar, pode ficar certo. Não adianta ficar nervoso que ninguém nunca vai parar de te chamar de Xandão", disse o petista, sob risadas.
A cerimônia no palácio teve a presença de petistas, ministros do STF e comandantes das Forças Armadas.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, não compareceu, mas mandou uma mensagem pelo ministro Edson Fachin. No texto, fez críticas ao que chamou de "narrativa falsa" de que enfrentar o extremismo "constituiria autoritarismo" e disse que "a mentira continua a ser utilizada como instrumento político naturalizado".
Participaram do evento ainda os ministros do STF Cristiano Zanin, Gilmar Mendes e Carmen Lúcia. Magistrados do STJ, como Daniela Teixeira e Luis Felipe Salomão, também marcaram presença.
Como a Folha de S.Paulo mostrou, havia expectativa de esvaziamento político, com maior presença de parlamentares de esquerda, o que se confirmou. Estiveram presentes os deputados Zeca Dirceu (PT-PR) e Lindbergh Faria (PT-RJ) e os senadores Jaques Wagner (PT-BA) e Eliziane Gama (PSD-MA), entre outros.
A cúpula do Congresso, no entanto, esteve ausente. Faltaram os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), bem como seus prováveis sucessores, Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União-AP).
Dirigentes partidários foram chamados, como Gilberto Kassab (PSD) e Baleia Rossi (MDB), mas não vieram. Além disso, todos os governadores foram convidados, mas apenas três foram: Elmano de Freitas (Ceará), Fátima Bezerra (Rio Grande do Norte) e Jerônimo de Freitas (Bahia), todos petistas. A vice-governadora de Pernambuco, Priscila Krause (Cidadania), participou representando o seu estado.
Após o evento, Lula participou de ato de partidos de esquerda e movimentos sociais na praça dos Três Poderes, um abraço simbólico ao local. Ele desceu a rampa com demais autoridades.
Ao longo do dia, houve três eventos no Palácio do Planalto em memória do 8 de janeiro. Pela manhã, Lula apresentou peças depredadas na ocasião que foram restauradas, entre elas relógio trazido ao Brasil por dom João 6º em 1808 e uma ânfora (vaso).
O relógio foi restaurado na Suíça, sem custos para o governo brasileiro.
Já outras 20 obras foram restauradas por especialistas no Palácio da Alvorada, onde foi criado uma espécie de laboratório.
Em discurso que tratou das peças, a primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, disse que o ódio por trás dos ataques golpistas de 8 de janeiro continua "estimulando falas fascistas e autoritárias".
"O Palácio do Planalto, onde estamos hoje, foi vítima do ódio que estimula e continua estimulando atos antidemocráticos, que continua estimulando falas fascistas e autoritárias. Por isso, a nossa resposta é a união, a solidariedade e o amor", afirmou.
Assim como o presidente, ela também mencionou o filme de Walter Salles. Porém, foi mais direta ao mencionar Fernanda Torres.
"Não houve momento da história em que ações autoritárias aconteceram sem que nossos artistas levantassem a voz em defesa da democracia. (...) Um exemplo disso é o fato de nossa queridíssima amiga Fernanda Torres ter recebido uma premiação tão importante por sua atuação", disse.
Em um segundo evento, houve a apresentação da obra "As Mulatas" de Di Cavalcanti. O quadro foi rasgado em sete lugares e, segundo o Planalto, seu valor estimado era de cerca de R$ 8 milhões. Além disso, foi feita uma exposição no térreo do palácio com as demais obras.
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