Anúncio da Meta indica embate contra regulação e mudança sobre conteúdos políticos e minorias
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Além do fim da parceria com checadores de fatos, o anúncio realizado nesta terça-feira (7) pelo CEO da Meta, Mark Zuckerberg, indica que a empresa atuará de modo mais veemente contra iniciativas de regulação das plataformas globalmente.
O dono da Meta (que detém Instagram, Facebook, Threads e WhatsApp) diz que trabalhará com o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, "para resistir a governos ao redor do mundo que estão perseguindo empresas americanas e pressionando por mais censura".
O empresário citou a Europa e "tribunais da América Latina", no que foi lido como uma referência ao STF (Supremo Tribunal Federal), onde há iniciativas para ampliar obrigações das empresas.
A empresa anunciou ainda que voltará a recomendar conteúdos políticos, cuja circulação tinha sido reduzida nos últimos anos.
Zuckerberg argumenta que antes havia um apelo público para "ver menos conteúdo político", mas que "parece que estamos entrando em uma nova era", em que a empresa está "começando a receber feedback de que as pessoas querem ver esse conteúdo novamente".
A Meta também diminuirá restrições a temas como "imigração e gênero", sem deixar clara a abrangência que as mudanças de política de conteúdo devem tomar, e deixará de usar filtros para detecção automatizada de conteúdo nocivo para "violações de baixa gravidade", dependendo de denúncias de usuários.
Zuckerberg resume a medida como uma troca. "Vamos detectar menos conteúdos problemáticos, mas também reduziremos o número de postagens e contas de pessoas inocentes que removemos acidentalmente", diz.
Apesar de haver de fato uma série de relatos de erros das plataformas, por retirada de conteúdo de modo inadequado, há também críticas de que muito conteúdo nocivo fica online na plataforma, inclusive após denúncias de usuários.
A partir da linha de atuação anunciada, o caminho indicado é o de que os críticos que veem inação das empresas na remoção de conteúdo devem ganhar ainda mais argumentos.
Isso porque, diante do volume de conteúdo postado todos os dias, o uso de detecção automatizada seria essencial para moderação efetiva -o que, segundo Zuckerberg, permaneceria para "violações ilegais e de alta gravidade".
Ancorando a defesa dessas novidades na suposta defesa da liberdade de expressão, Zuckerberg usou diferentes argumentos e termos alinhados ao discurso de líderes da extrema direita.
Quanto ao fim das parcerias com checadores, Zuckerberg disse ainda que começará a usar modelo semelhante ao usado pelo X (antigo Twitter), chamado Community Notes, e que foi implementado por Elon Musk -grande doador de Trump e que participará da gestão do republicano.
Líder de pesquisa em tecnologia, poder e inovação no Weizenbaum Institute, na Alemanha, Clara Iglesias Keller avalia que o anúncio demonstra a necessidade de políticas públicas que estabeleçam balizas para a atuação das plataformas.
"Esse anúncio é mais uma prova de que a gente tem uma esfera pública em grande extensão digitalizada em que a circulação de conteúdo fica a critério exclusivo de empresas globais muito poderosas"
"Não existe mecanismo de participação democrática propriamente dito nesses processos", diz. "São decisões unilaterais da plataforma", acrescentando ver mais uma atuação por inspiração ideológica com interesses comerciais do que uma reação a um clamor popular.
Newsletter Desvendando IA Um guia do New York Times em formato de newsletter para você entender como funciona a IA *** Para Francisco Brito Cruz, diretor do Internet Lab, o anúncio coloca a empresa em maior rota de colisão com uma série de atores no plano geopolítico internacional e mostra ainda um reposicionamento contra a regulação de conteúdo, saindo de uma postura de maior cooperação.
"Isso culmina numa mudança nessa aposta de colaboração, de pelo menos dizer que está querendo trabalhar, [que] só não concorda com o que está sendo proposto, mas concorda que vale a pena alguma coisa ser proposta", diz.
"Ainda existia um verniz -que, em alguns casos, era um esforço de relações públicas e, em outros, eram ações mais concretas. Acho que o que esse movimento coloca é que esse verniz não vai mais existir."
Ele também vê como irresponsável a menção, ainda que indireta, ao STF, sem nuances ou desconsiderando, por exemplo, ações de agências de inteligência dos EUA.
Em claro aceno ao STF (Supremo Tribunal Federal), que tem sido um dos principais atores sobre o tema no Brasil, Zuckerberg criticou "países da América Latina" que "têm tribunais secretos que podem ordenar que empresas removam conteúdos de forma silenciosa".
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