Chineses e americanos dividiram atenção na corrida à Lua em 2024
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O ano de 2024 marcou o início da era de exploração comercial da Lua, por parte dos Estados Unidos, e pela primeira vez uma espaçonave trouxe de volta amostras do hemisfério oculto do satélite natural, cortesia da missão chinesa Chang'e 6.
Ambos os casos exemplificam como a disputa para o retorno à Lua após décadas de abandono dominou o ano que passou e dividiu as atenções entre as duas maiores potências espaciais do século 21: Estados Unidos e China.
Os americanos, com uma nova estratégia para fomentar a exploração lunar, engajando a iniciativa privada para a criação de módulos de pouso robóticos de baixo custo, tendo a Nasa (agência espacial americana) como apenas uma das clientes.
Os chineses, por sua vez, focados em seu programa lunar estatal, que já serve como precursor para futuras missões tripuladas à Lua, que a CNSA (agência espacial chinesa) pretende conduzir até 2030.
É essencialmente uma disputa entre o novo e o velho modelo. E, como se esperaria de uma competição nesses moldes, o esquema antigo produz resultados mais seguros e chamativos, enquanto o novo enfrenta percalços, mas oferece a perspectiva de um futuro promissor.
Duas missões lunares americanas foram lançadas à Lua: a Peregrine, da empresa Astrobotic, partiu em janeiro, mas teve um vazamento de combustível que impediu sequer uma tentativa de alunissagem; já a Odysseus, espaçonave da companhia Intuitive Machines, foi lançada em 15 de fevereiro e uma semana depois se tornou a primeira missão privada a realizar um pouso suave lunar. Apesar de ter tombado na descida, suas cargas úteis operaram normalmente em uma região próxima ao polo sul da Lua.
Já os chineses lançaram sua Chang'e 6 em maio, e a sonda operou perfeitamente para trazer amostras da região da bacia do Polo Sul-Aitken, no lado afastado da Lua cerca de 2 kg, trazidos de volta à terra em 25 de junho. As rochas já estão sendo analisadas e começam a revelar os segredos do hemisfério oculto lunar, que se mostra bem diferente do lado próximo, que podemos ver daqui da Terra.
O ano também foi marcado pelo primeiro pouso suave de uma sonda robótica japonesa na Lua, em 19 de janeiro. A Slim demonstrou uma técnica nova de descida de alta precisão e sobreviveu até mesmo ao frio (-120°C) de três noites lunares, um bônus inesperado. Com a missão, o Japão se tornou o quinto país a pousar um artefato na Lua, depois de EUA, Rússia, China e Índia.
NOVOS FOGUETES
A última temporada também foi prolífica no teste de novos lançadores. A empresa United Launch Alliance, americana, demonstrou com sucesso o seu foguete Vulcan, em 8 de janeiro, com o qual o governo americano espera ter redundância para lançamentos militares caso haja algum problema com os lançadores da SpaceX, hoje a principal fornecedora.
Os europeus também voltaram ao jogo dos lançamentos com o primeiro voo de seu novo veículo de grande porte, o Ariane 6. Desenvolvido pela empresa francesa Arianespace, ele atingiu a órbita em 9 de julho, mas apresentou um problema com o segundo estágio, que ainda precisa ser totalmente demonstrado.
O foguete que roubou todas as atenções, contudo, foi o Starship, graças ao programa agressivo de testes da SpaceX. O mais poderoso lançador já construído voou nada menos que quatro vezes em 2024, depois de ter feito dois voos em 2023.
As quatro missões deste ano demonstraram o desempenho confiável do primeiro e do segundo estágios na ascensão e em um deles, em 13 de outubro, até mesmo a demonstração da recuperação do primeiro estágio para futuro reuso, com pouso na própria plataforma de lançamento algo nunca feito antes.
A Nasa conta com o Starship para realizar o primeiro pouso lunar tripulado do século 21, na missão Artemis 3, marcada para 2027.
Já os chineses estão desenvolvendo seu próprio foguete lunar, o Longa Marcha 10. Ele só deve fazer seu primeiro voo em 2027, mas neste ano, em 30 de novembro, os chineses realizaram o primeiro voo do Longa Marcha 12, um lançador menor, mas que usa os mesmos motores que o 10 usará em seu primeiro estágio.
A China também ambiciona estimular empresas startups espaciais, e um marco importante foi atingido por lá em 2024: o foguete de médio porte Gravity-1, da companhia Orienspace, teve sucesso e atingiu a órbita em seu primeiro voo, em janeiro. O veículo foi especialmente desenhado para baixo custo e voo frequente, capaz de atender à demanda de grandes constelações de satélites.
SUCESSO PELA METADE
Na esteira do sucesso da SpaceX, a Boeing se tornou a segunda empresa do mundo a lançar astronautas à órbita da Terra. Mas a glória se transformou em constrangimento quando, após um lançamento marcado por problemas antes, durante e depois, a Nasa decidiu não arriscar o retorno dos astronautas na cápsula Starliner, que voltou vazia. Ao menos a reentrada foi conforme o esperado.
A grande dúvida que o projeto deixa para o ano que vem é se ele vai continuar, embora a agência americana conte com ele. Por ora, só a SpaceX segue com capacidade de transporte de astronautas, e caberá a ela trazer Butch Wilmore e Suni Williams, os tripulantes da Starliner, em fevereiro próximo.
PARA ALÉM DA LUA
O ano de 2024 também trouxe marcos importantes para missões interplanetárias. A maior delas é a Europa Clipper, prioridade da Nasa para a exploração robótica do Sistema Solar. Em outubro, ela foi lançada por um foguete Falcon Heavy, da SpaceX, a caminho de Júpiter, onde vai investigar a habitabilidade de Europa, uma das luas daquele planeta, que tem um oceano de água líquida sob sua superfície congelada. A jornada, contudo, é muito longa, e a chegada é prevista somente para 2030.
Também partiu em outubro uma missão da ESA (Agência Espacial Europeia), a Hera. Propelida por um foguete Falcon 9, da SpaceX, ela visitará o asteroide duplo Dídimo, para investigar os efeitos da missão de redirecionamento de asteroide conduzida pela Nasa em 2022, a Dart. Sua chegada ao destino deve acontecer em dezembro de 2026.
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