Morre Magda Soares, referência na alfabetização do Brasil, aos 90 anos
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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Morreu neste domingo (1º), aos 90 anos, a educadora Magda Becker Soares, referência nos estudos sobre alfabetização e na formação de professores no Brasil. Ela tinha câncer.

O fim da exigência do diploma de jornalista produziu a bagunça atual
Uma das fundadoras da Faculdade de Educação da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), da qual era professora emérita, Magda Soares dedicou sua vida à melhoria das escolas públicas e ao combate às desigualdades educacionais e sociais. "Esse é o problema que mais me incomoda, me choca e me revolta nesse país, que são as discriminações sociais", declarou durante debate em 2020.
Autora de diversas obras, ela ganhou o Prêmio Jabuti em 2017, na categoria educação e pedagogia, pelo livro "Alfabetização: a Questão dos Métodos" (ed. Contexto), em que defende que as reflexões sobre o ensino da leitura e da escrita devem ir além do tipo de método adotado.
"A discussão na alfabetização sempre ficou na questão dos métodos. Qual usar? Qual é melhor? Fiquei 40 anos na universidade trabalhando com formação de professores e fazendo pesquisas, e a pergunta que me fazia era a seguinte: todo mundo dá o método, mas o método tem que estar com a base em teorias, em fundamentos. Cada método tem uma coisa certa aqui, mas nunca é tudo", declarou em 2017 em entrevista à Folha de S.Paulo.
Magda Soares foi uma das difusoras do conceito de letramento, "o desenvolvimento das habilidades que possibilitam ler e escrever de forma adequada e eficiente, nas diversas situações pessoais, sociais e escolares em que precisamos ou queremos ler ou escrever", como ela definiu. Essa ideia amplia e complementa o conceito de alfabetização, geralmente associado ao domínio do sistema alfabético e de outras normas da língua, sem considerar as diferentes necessidades e contextos de seu uso.
Seu esforço de organizar a produção acadêmica na área, e assim consolidar a alfabetização como campo de conhecimento, levou à criação, em 1990, do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da UFMG -o Ceale-, dedicado a projetos de pesquisa, de documentação e de formação de professores.
Pesquisadora renomada, doutora e livre-docente, ela foi em 2015 a primeira educadora a ganhar o mais importante prêmio na área de ciência e tecnologia do país, o Almirante Álvaro Alberto, concedido pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Buscava, porém, respostas para os desafios da educação na própria realidade das salas de aulas do ensino básico. Em 2007, quando tinha 75 anos, ela iniciou o projeto Alfaletrar, atuando com professores da rede municipal de Lagoa Santa (região metropolitana de Belo Horizonte). A experiência, que melhorou a aprendizagem de crianças da rede e virou referência nacional, foi contada em seu último livro, "Alfaletrar: Toda Criança Pode Aprender a Ler e a Escrever" (Contexto), lançado em 2020.
"[O projeto de] Lagoa Santa me ajudou muito. Porque eu pude ver a coisa acontecendo e tentar fazer com que as professoras não ficassem atrás do 'que é que eu faço', mas atrás do 'por quê'", contou à Folha. Ao comentar o projeto, costumava destacar que construía o trabalho junto com as alfabetizadoras e que aprendia muito com elas.
"Com tudo o que estudei, eu continuo a ter dúvidas", relatou no debate de 2020. "Todas as minhas conclusões são provisórias. Eu digo que a pior coisa que tem é a pessoa que não tem dúvida, só tem certezas."
Deixa cinco filhos, quatro netos e dois bisnetos.

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