Compartilhe este texto

Programas de vigilância levam a disputa por prisões com uso de câmeras em SP

Por Folha de São Paulo

27/04/2025 11h45 — em
Variedades


ouça este conteúdo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em pouco mais de um mês, o secretário estadual de Segurança Pública, Guilherme Derrite, usou suas redes sociais para divulgar oito prisões feitas com base câmeras de segurança com reconhecimento facial. Movimento semelhante ao do prefeito Ricardo Nunes (MDB) que divulga com frequência cada atualização do número de criminosos detidos a partir da central de monitoramento da capital paulista.

O foco na divulgação das prisões é compartilhado pelos dois políticos alinhados à direita, que tem o combate a criminalidade como uma das principais bandeiras.

Nunes focou os cem primeiros dias de seu segundo mandato na prefeitura na segurança urbana, em uma ação para se fortalecer como possível candidato ao governo paulista em 2026. Já Derrite articula para disputar uma vaga ao Senado. Os dois, porém, negam motivações eleitoreiras na divulgação de suas respectivos ações.

No caso do programa estadual, o Muralha Paulista, as imagens usadas nas apreensões são captadas por câmeras particulares ou pertencentes aos municípios que possuem convênio com o governo. São equipamentos instalados em comércios e condomínios, por exemplo, com acesso compartilhado com o Centro Integrado de Comando e Controle (CICC) da Polícia Militar, onde as imagens são monitoradas.

O número de equipamentos próprios do Muralha Paulista não passam de 500, sendo que por volta de 300 estão em funcionamento, segundo policiais que trabalham no CICC. Os equipamentos não têm reconhecimento facial e fazem parte de estruturas como delegacias de polícia e rodovias.

O Muralha Paulista foi instituído pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) em setembro do ano passado em substituição ao Detecta, um dos principais legados das gestões tucanas na área da segurança pública no estado.

Uma das prisões divulgadas recentemente por Derrite, um procurado por tráfico de drogas em São Carlos, no interior paulista, por exemplo, foi feita a partir de imagens captadas por câmera com reconhecimento facial instalada pela guarda civil do município.

Uma mulher procurada por furto também foi presa por meio do sistema de monitoramento, mas, no caso, o rosto da acusada foi captado por câmera de um terminal de ônibus no centro da capital, e a prisão foi feita por policiais com base em banco de dados de procurados do Ministério da Justiça e da Polícia Civil.

Questionada, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) estadual não informou a quantidade de câmeras próprias do Muralha Paulista e anunciou a aquisição de 1.200 câmeras com reconhecimento facial a partir da segunda quinzena de setembro, quando o edital será lançado. Como parte disso, 19 empresas participaram da audiência pública realizada no dia 27 de fevereiro no CICC para a elaboração do edital.

Está em andamento um acordo de cooperação técnica com a estatal Edge Group, dos Emirados Árabes Unidos, que "prevê a avaliação e eventual implantação de soluções tecnológicas", segundo a gestão Tarcísio.

Em comparação, o Smart Sampa, programa municipal de monitoramento iniciado em julho de 2024, tem cerca de 20 mil câmeras próprias instaladas com tecnologia de biometria facial, apesar de também operar em integração com equipamentos privados.

Atualmente, os dois programas funcionam de maneira separada, mas há plano para que eles funciionem de forma mais compartilhada. A secretaria estadual disse que o Muralha Paulista está em fase de integração com o Smart Sampa para o compartilhamento das câmeras municipais "possibilitando a emissão de alerta em tempo real sobre veículos e pessoas procuradas".

O uso recorrente dessas imagens geradas por empresas privadas pelas forças de segurança estadual e municipal, no caso, a GCM (Guarda Civil Metropolitana), é questionada por especialistas em privacidade e segurança da informação.

"Há um impacto sério de privatização da segurança pública, que não atende necessariamente a critérios, por exemplo, de publicidade, transparência e prestação de contas, mas sim econômicos", diz Andre Ramiro, pesquisador do Digital Civil Society Lab da Universidade Stanford, nos Estados Unidos.

Ele diz que os decretos que criaram os programas estendem os direitos de usuários a todos os órgãos que fazem parte do Sistema Único de Segurança Pública, o que abre margem para riscos na gestão de acesso e responsabilização difusa. "A privacidade é inevitavelmente violada", diz o pesquisador.

Além disso, tanto o decreto estadual quanto o municipal não preveem a necessidade de ordem judicial para acesso às imagens. E a legislação nacional sobre proteção de dados do país exclui a área de segurança pública da sua alçada, o que cria um limbo jurídico que dificulta a fiscalização, segundo Ramiro. "A digitalização da área sem fiscalização pode aprofundar o problema", diz.

Segundo decreto estadual que rege o Muralha Paulista, o acesso ao programa é vetado às empresas ou pessoas físicas conveniadas, mesmo que aceitem compartilhar suas imagens. Cabe à SSP a criação e gestão dos protocolos de segurança da informação.

Em relação ao Smart Sampa, o decreto municipal que criou o programa prevê a instalação de uma ouvidoria para o recebimento de denúncias de usuários. O texto também determina que o uso e captação das imagens devem seguir a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e exclusivamente para fins de segurança. As imagens que não estiverem atreladas às investigações são descartadas, segundo a administração municipal.

A reportagem procurou a SSP sobre o uso de imagens geradas por câmeras privadas pelo Muralha Paulista, e também questionou o número de equipamentos próprios do programa, mas não teve retorno.

Muralha Paulista Smart Sampa

Início em 4 de setembro de 2024 Início em 4 de julho de 2024

500 câmeras próprias* e previsão de comprar

1.200 câmeras a partir de setembro 20.000 câmeras próprias e previsão de agregar até 20.000

câmeras privadas por meio de convênio

Sem biometria facial Com biometria facial

Orçamento: R$ 527 milhões por ano** Orçamento: R$ 9,8 milhões mensais

*SSP não informou número oficial de câmeras próprias

**inclui as câmeras corporais dos policiais militares


Siga-nos no
O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

ASSUNTOS: Variedades

+ Variedades


02/05/2025

Correção