Ex-Menudo que é peça-chave no caso dos irmãos Menéndez converteu-se no Brasil e fala em perdão
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Roy Stephan Rosselló, 54, conheceu a fama global duas vezes. Na primeira, como um dos jovens integrantes do Menudo, banda porto-riquenha que também contou com Ricky Martin e virou sensação nos anos 1980.
Ele volta ao noticiário internacional agora, tratado como peça-chave num dos casos judiciais mais ruidosos dos Estados Unidos nos últimos anos. Em entrevista ao jornal, o cantor fala sobre o dia em que, segundo ele, foi estuprado por José Menéndez.
O relato encorpa a defesa dos irmãos Lyle e Erik Menéndez, em prisão perpétua desde 1990, após matarem os pais, José e Kitty, na mansão onde a família vivia em Beverly Hills, na Califórnia.
Na época, eles foram retratados como uma dupla inescrupulosa de olho no patrimônio dos pais. A Justiça americana remarcou para o fim de janeiro uma audiência que pode reconsiderar um argumento ignorado à época: eles só atiraram com uma espingarda seis vezes no pai, e dez na mãe, porque tinham medo de José. Lyle e Erik dizem que por anos foram sexualmente abusados pelo pai, com anuência da mãe.
A denúncia que Rosselló apresentou mais recentemente, e que pode ajudar a virar o jogo em favor dos irmãos, sustenta que José teria o dopado e estuprado. Ele era executivo da RCA, gravadora do Menudo.
Rosselló falou pela primeira vez sobre o episódio em 2023, na série documental "Menéndez + Menudo: Boys Betrayed". "Este é o homem que me violentou, é ele o pedófilo", afirmou então, apontando para uma foto de José, que ele conheceu aos 13.
O maior culpado, diz à reportagem, foi Edgardo Díaz, empresário que idealizou o Menudo. Ex-membros da banda já haviam descrito uma série de abusos que sofreram naquela temporada musical. "Meu maior trauma foi a maneira como fui enganado por ele. Eu era apenas uma criança."
"Fui levado a acreditar que seria uma simples refeição na casa de José Menéndez, o poderoso diretor da RCA, onde foi firmado um contrato milionário. Eu, um menino ingênuo, sem noção do que estava prestes a acontecer", diz.
Segundo Rosselló, Díaz, "uma figura de autoridade" em sua vida, o manipulou junto com José para que tomasse "uma taça de vinho que continha algo a mais" que o deixou completamente dopado. Ele afirma que acordou já no hotel, sangrando.
"Essa experiência foi extremamente traumática, tanto física quanto emocionalmente. Fui usado de forma muito cruel e desumana, e essa situação afetou minha alma de maneira profunda."
Diáz passou a ser investigado pela polícia de Los Angeles em 2023, após Rosselló implicá-lo em abusos seriais. Ele já os negou no passado. Em 2014, declarou que não passaria "o resto da vida me defendendo e respondendo a acusações", porque "só existe uma vida, e vivo em paz".
Rosselló escreve e fala em português em todos os contatos com a reportagem, por texto e áudio. Hoje mora em Miami, mas o porto-riquenho viveu por anos no Brasil, em vaivéns entre 1987 e 2023. Sua relação com o país se funde inclusive com alguns símbolos do imaginário popular.
Em 1987, por exemplo, ele apareceu no programa de Raul Gil com um conjunto dourado e preto que combinava com a roupa de sua namorada da época, Mara Maravilha. Também já participou do reality A Fazenda, em 2014, edição que também teve o duo Pepê e Neném e a ex-paquita Andréa Sorvetão.
Na ocasião, disse que perdoava Edgardo "pelos abusos". Aproveitou ainda para se dizer vítima de "uma injustiça" uma acusação de agredir uma ex-mulher na Bahia. Na mesma edição da Fazenda, chegou a ser detido por não pagar pensão alimentícia para um dos cinco filhos, entre 15 e 38 anos, que tem com diferentes mulheres. Quitou a dívida, voltou para o reality e acabou sendo o terceiro eliminado pelo público.
Dois anos depois, abriu uma lanchonete em Porto Alegre, a X Tribom, com a assinatura "by Roy Rosselló" no letreiro. Diz que o empreendimento foi um presente para Patricia, sua então mulher e hoje ex, que foi miss no Rio Grande do Sul nos anos 1990.
Ele também viveu na Paraíba e já teve um restaurante mexicano em Campinas. Conta se sentir um "brasileiro nato" que se mudou para cuidar da mãe "e acompanhar de perto o caso dos irmãos Menéndez". Mas o plano é retornar ao Brasil "[É] um país que me acolheu e me fez sentir amado", diz.
Sua carreira musical não parou, ainda que a popularidade dos tempos de Menudo seja coisa do passado. Ele destaca uma gravação de "Volver a Empezar", famosa na voz de Julio Iglesias, que fez para a novela da Globo "Ti Ti Ti", de 2010. Cantou-a com Valéria Flor Cigana, seu par no duo Parayzo, projeto musical que ficou para trás.
Também começou a cantar gospel. O artista credita sua conversão evangélica a Wesley Ros, um pastor que concorreu a deputado federal em 2022, pelo PL de Jair Bolsonaro, admirado pelo cantor. Ros teve 16 mil votos na época, insuficientes para se eleger ao cargo.
"Com o pastor Wesley, gravei três louvores que não tiveram fins lucrativos, mas que eram muito significativos, pois eu os cantava em meus testemunhos em igrejas evangélicas", conta. "Esses momentos me permitiram levar a mensagem de fé para pessoas que, assim como eu, passaram por situações difíceis, como abusos."
O cantor é missionário há uma década. "[Foi] um chamado que transformou completamente minha vida e me trouxe um propósito maior", diz. É uma das ocupações que lista em suas redes sociais, ao lado de "influencer" e "ex-Menudo". Fala em nome da igreja Semeando Amor, com sede na mineira Uberlândia, e do Ministério Roy Rosselló.
Wesley chegou a declarar à TV que seu discípulo fez parte do que talvez seria "a maior boy band depois de Beatles", o que lhe trouxe "muito dinheiro, glamour, luxúria, fãs". Com um porém. "Só não conhecia Deus."
Hoje o evangélico Rosselló diz que busca sempre pregar "a importância do perdão". "Acredito que o primeiro passo para a transformação é aprender a perdoar a si mesmo, libertar-se da culpa e, em seguida, estender esse perdão àqueles que, de alguma forma, nos causaram dor."
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