Setor editorial tem preço do livro e fuga de leitores para tentar resolver em 2025
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Não tem jeito. O ano de 2025, para o mercado editorial, vai precisar ser um ano de busca de soluções -após anos de sucessivas crises, que resultaram em números catastróficos para o setor.
Para refrescar a memória: o Brasil perdeu, segundo a pesquisa Retratos da Leitura, quase 7 milhões de leitores nos últimos cinco anos; e o faturamento das editoras, mostraram dados da Nielsen, teve uma queda real de 43% desde 2006. Não é pouco.
Com o ano que começa, se encerra uma década marcada por grandes obstáculos: uma crise econômica, a redução de compras governamentais e a derrocada das livrarias Cultura e Saraiva, entre outros abacaxis.
Além disso, há uma crise maior, não só do Brasil. Na competição com novas formas de entretenimento, o livro costuma levar a pior.
As soluções são complexas e envolvem muitas frentes. Uma das principais em que o mercado editorial vai apostar é a implantação de uma lei do preço fixo do livro no Brasil, a chamada Lei Cortez, que está em tramitação no Congresso e tem aprovação incerta, apesar do apoio do governo.
Normas do tipo existem desde o século 19 na Europa e, hoje, estão em vigor em alguns dos maiores mercados leitores do mundo. Essas leis proíbem que as livrarias deem descontos grandes em títulos por determinado período após o lançamento. No Brasil, esse desconto máximo seria de 10%, por até um ano.
Editores e livreiros do país veem nessa medida um jeito de proteger as livrarias de bairro e impedir que varejistas mais poderosos dominem o mercado.
A polêmica sobre os descontos antecede a chegada da Amazon no Brasil, mas se acirra com o rápido crescimento da empresa no comércio de livros do país.
Os defensores da lei dizem que descontos como os da empresa estrangeira, no fim das contas, deixam os livros mais caros.
"Quando uma varejista generalista força os editores a darem mais desconto, ele obriga as editoras a subirem o preço de capa. Mas, com isso, também sobe o preço para a livraria", diz Diego Drummond, vice-presidente da Câmara Brasileira do Livro e sócio da Faro Editorial. "A conta que faço é que vai dar para diminuir o preço se a lei passar."
O que pode ser um problema para muitas editoras é que, na prática, o preço do livro já caiu 36,4% em termos reais desde 2006. E o desafio, na última década, tem sido justamente fazer os valores de capa pelo menos acompanharem a inflação -sem, com isso, espantar os leitores. Como diminuir o preço nesse contexto?
A CBL e a ANL, a Associação Nacional de Livrarias, por exemplo, se amparam em estudos como um publicado no Journal of Competition Law & Economics, mostrando que países com lei do preço fixo tiveram vendas mais altas, sem efeito notável no preço -ou com um crescimento de preço menor do que em nações sem regras do tipo.
O Brasil, contudo, seria um caso inédito a se observar. Lá fora, os países que limitam descontos nos livros têm leis criadas antes da existência da Amazon, além de terem um mercado leitor mais robusto.
Além disso, há outro ponto para o mercado discutir nessa área em 2025: a Lei Cortez limita descontos em lançamentos, mas estes vêm perdendo espaço ao longo dos anos na lista de mais vendidos.
A Nielsen mostrou que, em 2023, os lançamentos foram responsáveis por 15% do faturamento das editoras. No passado, esses títulos já foram quase um terço do total. Nesse cenário, que diferença faria proibir descontos?
"Os lançamentos vão ficando cada vez menos importantes porque as pessoas estão deixando de comprar nas livrarias e, por isso, não descobrem o que está sendo lançado", diz o livreiro e editor Alexandre Martins Fontes, presidente da ANL, defendendo que a lei poderia reverter esse fenômeno.
Na pesquisa Panorama do Consumo de Livros, realizada pela Nielsen Bookdata, 60,3% dos entrevistados que fizeram compras online elencaram o preço como principal motivo para escolher aquele canal de vendas -e 64% compraram com desconto.
Quanto o livro custa também é importante para quem comprou em pontos físicos: 22,3% elencam o preço como principal motivo para escolher o lugar onde fizeram sua última compra e 43% aproveitaram um desconto (mas 41% adquiriram títulos com preço cheio).
Mas o preço não é o único problema a ser equacionado, inclusive na formação de novos leitores. Só 5% o elencam como motivo para não ter mergulhado em mais livros no ano, segundo a Retratos da Leitura -a principal razão é, disparada, a falta de tempo (46%).
Já entre aqueles que não leem, só 1% falam que o motivo é o fato de o livro ser caro. Nos primeiros lugares, surgem a falta de tempo (33%), não gostar de ler (32%) e a falta de paciência (13%), entre outros.
"Ou seja, o preço aparece lá embaixo entre as dificuldades para leitura", diz Zoara Failla, coordenadora do levantamento. "Na pesquisa do mercado [a Panorama do Consumo de Livros], o preço aparece em primeiro, mas esse é aquele consumidor de livro, para quem o preço passa a ser importante."
O que os dados indicam como desafio para 2025 e os anos seguintes é uma base leitora -e consumidora, portanto- baixa. A Nielsen mostrou que, no ano passado, só 16% da população brasileira com mais de 18 anos tinha comprado um livro. É pouco, mas também indica uma demanda reprimida.
"Existem duas possibilidades para o mercado do livro: trabalhar com esses 16% de consumidores ou pensar em estratégias para ampliar essa base", diz Mariana Bueno, coordenadora de pesquisa econômica da Nielsen. "No curto prazo, alcançando pessoas que têm capacidade leitora e não consomem. No longo, a ampliação depende de políticas públicas."
O percentual de leitores é bem distribuído pelas regiões do Brasil. Mas, no Norte e no Nordeste, por exemplo, está concentrado o maior percentual de pessoas que dizem não ter acesso a pontos de venda (33% e 32%).
Além disso, se a maioria (55%) prefere comprar na internet, ainda é grande o número (40%) dos que preferem fazer sua escolha passeando por estantes físicas.
Em resumo, está longe de ser uma tarefa simples resolver o imbróglio em que o setor livreiro está. Não vai faltar trabalho em 2025.
ASSUNTOS: Arte e Cultura