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MPF denuncia ex-agente da ditadura por morte de militante que ficou décadas sem identificação

Por Portal Do Holanda

05/07/2018 17h37 — em
Brasil



SÃO PAULO — Em mais uma denúncia por crimes cometidos durante a ditadura, o Ministério Público Federal (MPF) pediu que o ex-suboficial do Exército Carlos Setembrino da Silveira responda pela morte de Dimas Antônio Casemiro, dirigente do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT), em 1971. O médico legista Abeylard de Queiroz Orsini também foi denunciado por omitir informações na necrópsia.

Segundo o procurador Andrey Borges de Mendonça, o ex-suboficial seguiu ordens de Carlos Alberto Brilhante Ustra, comandante do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna, o DOI/CODI, braço de repressão da ditadura militar.

Apesar do crime ter ocorrido em 1971, o MPF defende que a prescrição não se aplica nesse caso, por se tratar de crime contra a humanidade, considerado imprescrítivel. O assassinato ocorreu, dizem os procuradores, em um contexto de violações de direitos humanos cometidas pela ditadura contra parte da população.

Nesta quarta-feira, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil por não investigar e punir os responsáveis pelo assassinato do jornalista Vladimir Herzog.

Borges de Mendonça afirmou que o homicídio ocorreu com motivo torpe, inserido em um contexto de busca de manutenção "do poder usurpado em 1964, mediante violência e uso do aparato estatal para reprimir e eliminar opositores do regime e garantir a impunidade dos autores de homicídios, torturas, sequestros e ocultações de cadáver".

Além do homicídio e da omissão e inclusão de informações falsas no laudo necroscópico de Dimas, Abeylard e Setembrino atuaram na ocultação do cadáver, afirmou o procurador.

Apesar de ter sido identificado no momento de sua morte, em frente à sua casa, onde estavam sua mulher e um filho, Dimas foi enterrado como indigente no cemitério Dom Bosco, em Perus. Seu corpo somente foi localizado, em uma vala clandestina, em 1990 e identificado por DNA em fevereiro de 2018.

"As condutas imputadas foram cometidas no contexto de um ataque sistemático e generalizado à população civil, consistente, na organização e operação centralizada de um sistema semiclandestino de repressão política, baseado em ameaças, invasões de domicílio, sequestro, tortura, morte e desaparecimento dos inimigos do regime", escreveu o procurador.

Dois dias antes da morte de Dimas, em 15 de abril, militantes do Movimento Revolucionário Tiradentes e da Aliança de Libertação Nacional mataram o então presidente da Ultragás e diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Albert Henning Boilesen, fundador e financiador da Operação Bandeirante, centro de informações criado para perseguir "grupos subversivos" segundo a ditadura militar.

O Exército, então, passou a perseguir os integrantes dos dois movimentos. Após sessões de tortura, testemunhas levaram os agentes do Exército à residência de Dimas onde, descaracterizados, oficiais aguardaram sua chegada. Ao chegar à sua casa, Dimas percebendo a ausência de sua mulher na porta, pressentiu a presença dos soldados e tentou fugir.

Armados com fuzis e armas de longo calibre, os agentes dispararam contra Dimas Casemiro, que carregava um revólver calibre 38.

"Dimas foi alvejado por diversas vezes, inclusive tendo sido atingido ao menos três vezes pelas costas com armas de longo alcance, quando tombou com o rosto em um monte de cascalho", afirmou o procurador.

O militante morreu ao lado do carro onde estavam as duas testemunhas que levaram os agentes do Exército ao local, além do Carlos Setembrino, que teria dado cobertura e apoio à execução.

"A versão oficial da morte de DIMAS foi de que teria morrido ao resistir à prisão.10 No entanto, em verdade, os agentes da repressão executaram DIMAS, sem qualquer chance de reação, inclusive com diversos disparos pelas costas", disse Andrey Borges de Mendonça.

O corpo de Dimas só deu entrada no IML dois dias depois de sua morte. No exame, constava a letra T, referência a "terrorista". No laudo, o médico Abeylard de Queiroz Orsini teria omitido os disparos pelas costuas para ocultar a execução de Dimas. Não foram fotografados os braços e pernas ou o corpo despido da vítima, mas apenas seu dorso superior o que, segundo o Ministério Público Federal, indica o objetivo de evitar que as lesões fossem constatadas.


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O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

ASSUNTOS: ditadura militar, MPF, Brasil

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