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Alta na Selic pode inflar dívida bruta em R$ 50 bi, 70% da economia prevista em pacote de Haddad

Por Folha de São Paulo

11/12/2024 18h30 — em
Economia



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O aumento de 1 ponto percentual na Selic anunciado nesta quarta (11) pelo Banco Central deve inflar a dívida bruta do Brasil em R$ 50 bilhões. O valor equivale a mais de dois terços dos R$ 70 bilhões de economia previstos pelo pacote do ministro Fernando Haddad (Fazenda) para os próximos dois anos.

A alta na taxa básica de juros é um dos fatores que pioram os indicadores de endividamento do país, dado que o custo da dívida fica maior.

O próprio Banco Central calcula qual esse impacto da Selic sobre a dívida bruta do governo, indicador mais utilizado pelos economistas para medir o endividamento do país. Segundo o cálculo mais recente, divulgado no fim de novembro, a elevação de 1 ponto percentual na taxa de juros, se mantido por 12 meses, aumenta a dívida em R$ 50,3 bilhões.

O estudo do BC também calcula a influência de fatores como desvalorização do real e queda da inflação.

Atualmente, a dívida bruta brasileira -que abrange governo federal, INSS e governos estaduais e municipais- atingiu R$ 9 trilhões, o equivalente a 78,6% do PIB (Produto Interno Bruto).

Com a dívida mais cara, o esforço fiscal anunciado recentemente pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acaba tendo menos impacto. Como a Selic mais alta aumenta o endividamento -e o objetivo do pacote é ajudar a controlar a dívida--, os R$ 70 bilhões de economia projetados ficam "menores".

No entanto, economistas ressaltam diferenças importantes entre os dois valores, visto que o custo da dívida é uma despesa financeira e os cortes anunciados por Haddad focam os gastos primários, sobre os quais o governo tem controle.

Felipe Salto, economista-chefe e sócio da Warren Investimentos, lembra que metade da dívida bruta está vinculada à Selic. Segundo ele, o efeito fiscal das decisões de política monetária é relevante e tem de ser considerado nas análises de sustentabilidade da dívida/PIB.

"A questão é que os juros estão subindo, dentre outras razões, pela ausência de um programa de ajuste que, de fato, indique um horizonte próximo para a obtenção das condições de estabilidade da dívida", afirma.

Salto afirma que o aumento de custo da dívida é "despesa pura", mas destaca que não há alternativa, dado a meta de inflação que precisa ser perseguida e as expectativas que estão saindo de controle.

Sobre a alta da Selic enfraquecer o peso dos R$ 70 bilhões anunciados por Haddad, ele diz que o efeito de uma política fiscal frouxa é uma política monetária mais dura.

"Tudo redunda em dívida pública no fim do dia. Quem está equivocado é o governo, com uma condução das contas públicas que deixa muito a desejar, apesar dos esforços para conter o abono salarial, o salário mínimo, a previdência dos militares, o Fundeb e outros gastos."

Na avaliação do economista, que foi secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo e o primeiro Diretor-Executivo da Instituição Fiscal Independente do Senado Federal, o pacote de Haddad será insuficiente, inclusive no que se refere ao cumprimento das metas de resultado primário.

"Temos um déficit estimado para o ano que vem de cerca de R$ 96 bilhões, isso já sob efeito do pacote. Ora, onde está o cumprimento da meta zero? Aí não adianta reclamar que o Banco Central está aumentando os juros. Ele vai ficar assistindo à inflação sair do controle? Claro que não. Sua responsabilidade legal é justamente mantê-la controlada", diz.

Silvio Campos Neto, economista e sócio da consultoria Tendências, ressalta alguns pontos ao comparar os R$ 50 bilhões com os R$ 70 bi.

"A despesa com juros tem que ser entendida como uma consequência, não como uma causa. O BC, na verdade, tem que tomar suas decisões pensando nos objetivos da política monetária e não exatamente na questão da dívida", afirma.

Silvio destaca também que não é só a Selic que impacta a dinâmica da dívida. Parte da dívida bruta também é pré-fixada e uma outra depende de juros de mercado. Ou seja, não adiantaria o BC, por causa desse custo, não mexer nos juros, pois as taxas de mercado subiriam muito mais.

"O Tesouro teria que encurtar demais sua dívida, o que também gera fragilidades. Quer dizer, não tem muita saída."

O economista afirma que o impacto dos juros na dívida é um ponto que preocupa, mas argumenta que isso é mais uma consequência do que uma causa. Além disso, ele ressalta que não temos como analisar o cenário oposto. Isto é, não se sabe o que poderia acontecer com os juros se esse pacote de R$ 70 bilhões não fosse anunciado. "Certamente as taxas seriam ainda maiores."

Jeferson Bittencourt, head de macroeconomia do ASA, diz que não é a elevação da Selic que enfraquece os cortes anunciados por Haddad, mas a fraqueza do pacote que pressiona a Selic.

"Justamente esta percepção de que a disposição do governo de lidar com os gastos não vai até o ponto necessário de melhorar o resultado primário e, assim, controlar o expressivo crescimento da dívida, que faz com que o mercado coloque mais prêmios na curva de juros."


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