Clientes culpam Credit Suisse por prejuízo milionário em fundo
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Uma queixa de clientes do Credit Suisse por causa de perdas milionárias num fundo de investimentos pode chegar à Justiça.
O banco foi notificado extrajudicialmente em setembro por advogados de alguns clientes que, por recomendação de assessores do Credit, compraram cotas do Fundo Wave, criado para adquirir debêntures da 2W Energia cuja estruturação foi coordenada pelo próprio banco.
Segundo a notificação, a instituição atuou em todas as pontas, desde a estruturação para colocar os títulos de dívida da empresa no mercado até a criação de um fundo de investimentos para comprar todas as debêntures, além da recomendação desse fundo aos clientes.
Hoje a dívida da 2W com as debêntures está em R$ 606 milhões, segundo o balanço da empresa do segundo trimestre. O endividamento total da companhia é de R$ 1,9 bilhão. Somente os clientes representados pela ação extrajudicial têm R$ 5 milhões em debêntures.
Os advogados dos clientes pediram que o Credit entrasse em acordo para indenizá-los pelos prejuízos causados, em solução amigável, mas o pleito foi negado. Segundo os advogados, o próximo passo será recorrer à Justiça.
Procurado pela reportagem, o banco disse que não vai se manifestar. Em outubro, em sua resposta à notificação, o Credit Suisse diz que informações detalhadas sobre o fundo eram públicas e que não cabe indenização, "haja vista inexistir descumprimento de deveres regulamentares ou legais".
O Fundo Wave, criado pelo Credit Suisse, investiu 95% dos seus recursos em cotas do Wave FIP, que detém as debêntures da 2W e é gerido e administrado pela GV Atacama Capital (que, na época da notificação extrajudicial, se chamava Singulare).
Hoje em dificuldades financeiras, a 2W que agora se chama 2W Ecobank, após entrar no mercado de serviços financeiros ligados a sustentabilidade deu calote nos debenturistas e o patrimônio líquido do fundo chegou a praticamente zero.
Segundo a notificação, o Credit recebeu uma remuneração de R$ 20 milhões mais bônus extras para fazer a distribuição e colocação das debêntures no mercado.
"Para assegurar a colocação dessas debêntures e com isso viabilizar o recebimento dessa comissão de R$ 20 milhões mais bônus, o Banco Credit Suisse, via Credit WM [gestora da instituição], passou então a recomendar a seus clientes que aplicassem seus recursos no Fundo Wave, 'comprador' das debêntures", dizem os advogados dos cotistas na notificação.
Segundo eles, um gestor de patrimônio do Credit teria descrito o Fundo Wave como um produto voltado à aplicação financeira em debêntures de infraestrutura de companhia de primeira linha portanto, crédito privado com risco conservador.
Na época da emissão das debêntures, em 2021, a companhia captou R$ 400 milhões. O prazo de validade dos papéis era de quatro anos, ou seja, com vencimento em 2025, e elas seriam convertidas em 15% das ações da empresa em um IPO (oferta pública inicial), operação estudada à época pela companhia, até que a alta dos juros desmotivou as empresas a entrarem na Bolsa.
Grande parte dos recursos levantados com as debêntures foram usados na construção de um parque eólico. A empresa, portanto, fazia parte de um segmento que, vez ou outra, enfrenta crises no país, com quebras de companhias.
A defesa dos cotistas argumenta que esse tipo de investimento "está longe de ser uma aplicação conservadora".
OUTRO LADO
Em sua resposta à notificação, a que a Folha de S.Paulo teve acesso, o Credit Suisse diz que era do conhecimento de todos que o Fundo Wave tinha o objetivo de investir nas debêntures da 2W.
"O banco CS foi o coordenador líder da oferta pública com esforços restritos de distribuição, nos termos da Instrução CVM 476. Trata-se de informações públicas, amplamente divulgadas no contexto da oferta das cotas do Fundo Wave", diz a instituição financeira.
O Credit afirma que não houve conflito de interesses na operação, já que o fundo Wave FIP, que detém as debêntures, não é gerido pelo banco, e sim pela Singulare, que tem completa independência.
A instituição financeira cita resolução da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) para alegar que o Fundo Wave, este sim gerido pelo Credit, é destinado exclusivamente a investidores profissionais.
Segundo a resposta do banco no processo, investidores profissionais são pessoas que têm valor relevante de patrimônio investido e que, por isso, possuem mais conhecimento e condições de avaliar as informações de investimentos.
"Em função disso, a regulação, ao lidar com valores mobiliários voltados exclusivamente a investidores profissionais, presume que o investidor terá melhores condições que os demais para avaliar por si próprio as informações e riscos do investimento", diz o banco.
Um dos advogados do caso, Alfredo Sérgio Lazzareschi Neto, rebate essa argumentação. Ele disse à reportagem que o valor alto investido não é suficiente para depreender que a pessoa possui conhecimento sobre investimentos.
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