Dólar fecha em queda, a R$ 6,04, com falas de Haddad e Lira sobre pacote fiscal
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O dólar fechou em leve queda pelo segundo dia consecutivo nesta quarta-feira (4) -ainda acima da marca de R$ 6, mas um pouco mais distante do recorde nominal histórico de R$ 6,066 atingido na segunda-feira.
A moeda firmou no campo negativo no início da tarde e encerrou em baixa de 0,27%, cotada a R$ 6,044, em reação a declarações do ministro Fernando Haddad (Fazenda) e do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), sobre o pacote fiscal do governo.
O mercado também reagiu a dados do mercado de trabalho dos Estados Unidos e a falas de Jerome Powell, presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central norte-americano).
Haddad e Lira falaram em evento do portal Jota, em Brasília, pela manhã.
O chefe da ala econômica do governo criticou a forma como parte do mercado recebeu as medidas fiscais anunciadas na semana passada. Ele afirmou que pacote é suficiente para o momento e deve ser aprovado no Congresso ainda neste ano, mas não descartou a possibilidade de ajustes futuros, caso necessário.
O ministro ainda disse que mercado tem "toda legitimidade" para criticar, mas que o "filme é melhor que a fotografia".
Apresentado na quinta-feira, o pacote de cortes de gastos prevê uma economia de R$ 71,9 bilhões em 2025 e 2026, mas decepcionou os agentes financeiros por excluir propostas de maior impacto nas contas públicas e por incluir a elevação para até R$ 5.000 na faixa de isenção do IR (Imposto de Renda).
A Fazenda estima que o aumento da faixa de isenção terá um impacto de cerca de R$ 35 bilhões na arrecadação federal. Isso será compensado, segundo Haddad, por uma alíquota mínima de 10% no IR para quem ganha mais de R$ 50 mil por mês, o equivalente a R$ 600 mil por ano.
A apresentação das duas propostas ao mesmo tempo, em um momento de grande expectativa pela contenção de despesas, passou a mensagem de que preocupação do governo é mais política do que econômica, o que afetou a segurança sobre os ativos brasileiros.
Sobre isso, Haddad disse: "Não acredito que alguém possa classificar na literatura, política ou econômica esse gesto como um gesto populista, como estão dizendo. E não me parece que as medidas de contenção de gasto sejam irrelevantes como alguns estão querendo fazer parecer."
A desconfiança dos agentes financeiros também é sobre a matemática dos ajustes. "O anúncio pouco detalhado acerca do IR se tornou, perante ao mercado, o ponto fraco do pacote, uma vez de R$ 35 bilhões deixarão de ser arrecadados e não se sabe ao certo quais serão os benefícios trazidos à política fiscal brasileira", diz João Duarte, sócio da One Investimentos.
Há ainda a percepção de que as estimativas de economia de R$ 70 bilhões em dois anos estão infladas, minimizada por Haddad. Ele reforçou que as mudanças no IR são neutras do ponto de vista fiscal e que os técnicos da Fazenda "trabalharam muito" para fazer os cálculos.
"Não deu pouco trabalho. Deu muito trabalho. Conversar com cada ministro, sentar com o presidente, mexer no indexador do salário mínimo, mexer com o abono [salarial], mexer com o BPC [Benefício de Prestação Continuada], mexer com o Bolsa Família", disse.
"Agora tem que explicar. Os meus secretários estão aí dando entrevistas, fazendo reuniões com os agentes de mercado. Estão explicando."
As medidas geraram grande estresse no mercado e levaram levaram o dólar a bater recordes na base nominal -a que desconsidera a inflação- por quatro sessões consecutivas. Na terça, a moeda interrompeu a disparada ao fechar em leve queda de 0,09%, cotado a R$ 6,060, sob efeito da divulgação do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro do terceiro trimestre.
As variações da moeda têm sido tímidas, passada a forte reação inicial. "Sobe muito pouco ou cai muito pouco, ou seja, são movimentos facilmente reversíveis a depender do ritmo de aprovação do pacote fiscal e do quão profundo será esse pacote, depois de eventuais e necessárias modificações do Congresso Nacional", diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research.
Arthur Lira, no mesmo evento que Haddad, assegurou que o pacote fiscal será aprovado pela Câmara dos Deputados "nesta semana ou na outra", ainda que tenha criticado a articulação do governo no Congresso.
Segundo ele, há uma parcela de deputados que defende cortes mais duros do que os previstos pela equipe econômica.
"Vamos conseguir nessa semana, na outra, vamos dialogando. O governo está empenhado, o próprio presidente Lula deve estar preocupado com essa situação."
Na análise de Paloma Lopes, economista da Valor Investimentos, a "ineficiência do governo em comunicar o que será feito em relação ao pacote e ao IR" tem impedido uma queda maior do dólar.
"É preciso saber exatamente de onde vai sair o dinheiro [que vai compensar o aumento da isenção do IR], e até agora isso não está claro."
Há ainda a cena internacional na conta. A cotação do dólar, aqui, também foi influenciada pela queda da divisa globalmente.
Em discurso nesta tarde, Jerome Powell disse que o desempenho recente da economia dos Estados Unidos permite que o Fed seja mais criterioso com a trajetória dos juros.
"Podemos nos dar ao luxo de sermos um pouco mais cautelosos ao tentarmos encontrar a neutralidade" com a política de juros, afirmou o presidente do Fed, citando a força da economia norte-americana e uma inflação um pouco mais alta do que o esperado
Além disso, dados da ADP (Automatic Data Processing) mostraram que 146 mil empregos no setor privado dos EUA foram criados em novembro. O resultado veio ligeiramente abaixo da expectativa de 150 mil de analistas consultados pela Reuters.
O relatório antecede o "payroll" (folha de pagamento), que será divulgado na sexta e é a referência de indicador de mercado de trabalho por lá.
Com isso, operadores têm firmado apostas em um corte de 0,25 ponto percentual na próxima reunião do Fed neste mês, hoje na faixa de 4,50% e 4,75%.
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