Pacote de gastos do governo enfrenta entraves, e primeira votação é adiada
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Em seu primeiro teste no Congresso, o pacote de gastos do governo Lula (PT), que sequer foi totalmente apresentado, enfrentou resistência entre deputados.
Até agora, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já enviou à Câmara uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para tratar dos supersalários, um projeto de complementar para submeter novas despesas ao arcabouço fiscal e um projeto de lei comum para fazer o pente fino no BPC (Benefício de Prestação Continuada).
O governo ainda promete apresentar um projeto para revisar a previdência dos militares, e outro para tratar da ampliação do imposto de renda (IR) até R$ 5.000 -proposta que tem enorme resistência entre parlamentares.
Líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirma que o governo negocia para conseguir aprovar todo o pacote fiscal, além da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), até o fim do ano legislativo -que tem data limite prevista para 23 de dezembro.
"Precisamos aprovar o conjunto das matérias fiscais que foram encaminhadas para cá, temos [pela frente] uma forte turbulência internacional, sobretudo a partir da posse do novo presidente dos Estados Unidos [Donald Trump], sobretudo pelas medidas que ele pretende adotar na economia", afirmou.
Os presidentes do Senado e da Câmara, respectivamente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP-AL), já anunciaram que mudanças no IR não devem avançar em 2025, mas que propostas de corte de gastos terão celeridade.
Mas um dia após a apresentação da PEC, já pairam dúvidas se haverá vontade política para que o texto -que enfrenta divergências- seja aprovado até o final do ano, uma vez que este tipo de matéria precisa de mais tempo de tramitação até ser votada no plenário, além do apoio de três quintos do parlamentares.
Já sobre as outras duas propostas, ainda não há o apoio necessário para que elas sejam aprovadas.
A expectativa era que as urgências dos dois projetos fossem aprovadas nesta terça-feira (3) -o dispositivo faz com que pautas possam avançar diretamente para o plenário da Casa, o que permite que sejam aprovadas mais rapidamente.
No entanto, após uma série de reuniões durante o dia, não houve acordo sobre o tema, e até a simples apresentação dos pedidos de urgência teve dificuldade de caminhar.
Além de divergência da oposição, como o PL, o governo até aqui não conseguiu adesão de dois dos principais partidos que integram sua Esplanada dos Ministérios: União Brasil e PSD, que não estão de acordo com as propostas.
Para que estes requerimentos sejam protocolados no sistema da Câmara, eles precisam do apoio de pelo menos a maioria dos deputados, e as duas siglas resistiram para aderir.
O fizeram quando já era noite nesta terça, mas sem promessa de apoio nas votações, apenas assinando o pedido de urgência em nome do bloco partidário que integram -o União, com com PP, PSDB, Cidadania, Solidariedade, PRD, Avante e PDT, e o PSD com MDB, Republicanos e Podemos.
O PSD, inclusive, teve uma reunião com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, no Palácio do Planalto, de tarde, para que a assinatura fosse efetivada.
A bancada da sigla na Câmara reclama que, apesar de ter sido importante para aprovar medidas de interesse do governo até aqui na Casa, não vem sendo contemplada com cargos no governo.
Os líderes de União Brasil e PSD, Elmar Nascimento (BA) e Antônio Brito (BA), foram preteridos por Arthur Lira (PP-AL) na disputa pela sucessão da presidência da Câmara -o escolhido foi Hugo Motta (Republicanos-PB).
Sob reserva, parlamentares reclamam que a relação com o governo não está boa e que a negociação pode envolver cargos na nova mesa diretora da Câmara ou comissões.
Para tentar destravar a tramitação do pacote, o governo também articula para amenizar o clima tenso entre Congresso e Judiciário em razão da disputa pelas emendas parlamentares.
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Flávio Dino, determinou o desbloqueio das emendas, mas ampliou as exigências para o uso do mecanismo, contrariando uma lei que havia sido aprovada no Legislativo e sancionada por Lula.
A decisão revoltou parlamentares e ameaçou a tramitação não só do pacote, mas também da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2025, que precisa ser aprovada para determinar como o dinheiro da União deve ser aplicado.
O governo agiu para destravar R$ 7,8 bilhões em emendas, com a promessa de que sejam liberadas até esta sexta-feira (6), e por meio da Advocacia-Geral da União, entrou com um embargo na decisão de Dino, para tentar amenizá-la.
Mesmo assim, a PEC de corte de gastos ainda deve enfrentar resistência. Lira determinou que ela tramitará inicialmente pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.
A expectativa é que ela seja colocada na pauta da comissão nesta quarta-feira (4), mas até a noite de terça, ainda não havia acordo para isso.
Mesmo se der certo, a votação poderia ser adiada por um pedido de vistas de algum partido da oposição. Se acontecer, sua deliberação ficaria, no mínimo, para quinta-feira (5).
Caso seja aprovada, em tese ela teria que passar por pelo menos dez sessões de debate antes de ir ao plenário da Câmara, o que (supondo que fossem feitas reuniões todos os dias da semana) poderia acontecer só a partir do dia 19.
Contando que o recesso parlamentar está marcado para o dia 23, e que o texto ainda teria que ser debatido no Senado e, possivelmente, mais uma vez na Câmara, parlamentares influentes do Congresso apostam que não haverá tempo hábil para tudo isso.
Membros da base do governo estudam formas regimentais de encurtar essa tramitação, por exemplo juntando o texto desta proposta a uma outra PEC em fase já mais avançada e de tema semelhante -o que, no entanto, aumenta o risco de contestação judicial dessa tramitação.
E o texto ainda precisaria ser alvo de maior consenso, uma vez que atualmente ele enfrenta críticas inclusive de membros da base do governo.
Após as negociações desta terça, Lira se ausentou de Brasília por motivos particulares, mas retorna ao Distrito Federal na manhã desta quarta.
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