Verbos ensinar e aprender
Em homenagem ao Dia do Professor, passo a refletir depois de vinte anos fazendo explanações, e formando gerações, sobre o papel do professor universitário. Nos últimos anos o professor universitário buscou um aperfeiçoamento que, no meu entendimento, na verdade o distancia da profissão docente, uma vez que adquiriu uma disciplina de pesquisa, acumulando um conhecimento que não encontra pares para discussão em sala de aula, e muitas vezes até entre os colegas, pois estes (como todos nós hoje na universidade) não têm mais tempo para se reunirem e simplesmente conversarem.
Estão imersos em seus objetos de estudo. Os interlocutores disponíveis para os professores universitários são seus alunos nos espaços de sala de aula, onde deveria ocorrer parte do processo de ensino – cuja tarefa é do professor – e aprendizagem – cujo fenômeno é preferencialmente do aluno. A deduzir por depoimentos e apelos recebidos dos estudantes nos últimos anos, posso dizer que a distância entre estes e os professores aumentou.
E não foi pela relação de autoridade formal tradicional, mas pela autoridade do conhecimento acadêmico em nível de pós-graduação. Os estudantes universitários chegam na universidade com muitas carências conceituais herdadas do ensino básico e da própria cultura geral. Por outro lado, o professor universitário já iniciou um processo de desenvolvimento que não quer e não pode mais parar. As políticas educacionais o têm exigido este aprimoramento.
Os estudantes muitas vezes se tornam um empecilho para a continuidade daquele desenvolvimento, se o professor não recuperar a consciência de que a docência é ensino, pesquisa e extensão. O resultado desta falta de clareza ou consciência retomada é que se adotam procedimentos para o cumprimento dos programas das disciplinas que têm sido chamados de metodologia de ensino superior, mas que na verdade não se consegue nomear.
Esta metodologia tem se resumido na indicação de leituras de autores que vamos descobrindo no caminho de nosso desenvolvimento, e que, portanto, fazem parte de uma história de construção do conhecimento que é nossa, não do estudante. Tentamos a todo custo encaixar no processo de aprendizagem destes, os nossos saberes em construção.
Como fica a conjugação dos verbos ensinar e aprender neste contexto? Não teríamos que partir do conhecimento do estudante para então orientá-lo, no tempo dele, ao entendimento e compreensão de informações e reflexões de outrem, constituídas como instrumento para a construção autônoma (vinculada a seu interesse e responsabilidade) de seu conhecimento? Um sintoma da falta de entendimento e compreensão de tais informações e reflexões, a meu ver, motivada pela metodologia da palavra pronta e do devaneio, está numa realidade estonteante da sala de aula: a mudez dos estudantes. Por que eles não falam em sala de aula? Por que não conseguimos parar de falar? Mesmo não querendo ser, não estaríamos sendo autoritários com nossa autoridade do saber adquirido; sobre o qual muitas vezes estamos ainda incertos? Sobre o qual muitas vezes ainda estamos em fase de devaneios?
É metodologicamente correto nos darmos ao luxo dos devaneios teóricos, quando os estudantes não dominam conceitos fundamentais das disciplinas que tratamos com devaneios e liberdade de aproximações com nossos interesses teóricos? Em que, afinal, consiste na educação como prática da liberdade (positiva)? Estaríamos contribuindo para o desenvolvimento da autonomia (poder decisório, crítico e criativo) de nossos estudantes enquanto futuros profissionais de educação? E mais do que isto, estamos orientando como promover o mesmo com outrem, na medida em que obstruímos sua fala ingênua ou mágica, evitando que se exponha sem medo para então problematizá-la com respeito e consideração de sua história, dando-lhe a opção de escolher o caminho, desde que o fundamente coerentemente?
Isto me faz citar Freire: “O diálogo, que é sempre comunicação, funda a colaboração. Na teoria da ação dialógica, não há lugar para a conquista das massas aos ideais revolucionários, mas para sua adesão. O diálogo não impõe, não maneja, não domestica, não sloganiza”. É possível o diálogo entre alunos e professores quando estes tentam impor suas ideias, convencendo-os, seduzindo-os ou coagindo-os?
ASSUNTOS: Espaço Crítico