Torcida fala em 'medo instaurado' e evita camisas do Botafogo no Uruguai
RIO DE JANEIRO, RJ (UOL/FOLHAPRESS) - Os torcedores do Botafogo que já estão em Montevidéu vivem um clima de medo e têm evitado usar a camisa do clube pelas ruas da capital uruguaia antes da partida contra o Peñarol, nesta quarta-feira (30), pelo jogo de volta das semifinais da Copa Libertadores.
Desde a chegada ao país há um ambiente de tensão no ar. Há relatos de uruguaios incomodados e proferindo até mesmo ameaças de dentro de aviões que levaram os alvinegros do Rio de Janeiro para a cidade nos últimos dias.
A reportagem apurou que um grupo chegou a ter o táxi cercado na noite desta segunda (28). Eles não se feriram e conseguiram se livrar.
Um encontro de botafoguenses que aconteceria na noite desta terça (30) foi desmarcado por motivos de segurança. Circula também uma cartilha com recomendações aos alvinegros que estão em Montevidéu, sugerindo que não andem com camisas do clube, evitem andar em grupos grandes e optem por não entoar cânticos da torcida e falar português em espaços públicos.
Não há, porém, até o momento, um incidente mais grave relatado. A sensação de insegurança, no entanto, faz com que muitos já prefiram que o jogo aconteça de portões fechados mesmo com o ingresso em mãos.
O panorama atual tem um decreto do governo do Uruguai para que a partida aconteça com a proibição da entrada de visitantes. A Conmebol, por sua vez, reagiu exigindo que a torcida do Botafogo seja liberada, e que se isso não acontecer, o jogo será realizado sem a presença de público ou em outro local.
"O clima no meu voo e no que chegou antes do meu foi meio esquisito. Uma galera começou a desrespeitar os botafoguenses, os brasileiros que estavam no voo, beirando o racismo e praticando xenofobia. Falando que aqui no Uruguai íamos ver, que aqui não é a bagunça que é no Brasil... Sendo que absolutamente nenhum brasileiro fez nada. Uma parte tentou arrumar uma briga, mas ninguém entrou na pilha", disse o influencer botafoguense Gustavo Chagas, complementando:
"Os cuidados que estamos tomando aqui são não andar com camisas do Botafogo e estar sempre todo mundo junto. Acho que o clima, por mensagens de grupo, está deixando a galera (alvinegra) mais pilhada do que a situação realmente está. Minha estadia, por enquanto, está relativamente tranquila, mas para ser sincero, estou achando que a maioria já está preferindo que não tenha torcida nenhuma no estádio (portões fechados), porque o medo está instaurado aqui entre a torcida. A galera não está mais tanto querendo ir no estádio pois não está se sentindo segura."
ACUSAÇÕES DE NARRATIVAS DISTORCIDAS
Outro ponto de preocupação dos alvinegros em Montevidéu é com o noticiário da imprensa uruguaia. Segundo os torcedores, há uma narrativa praticamente geral e idêntica à do presidente do Peñarol, Ignacio Ruglio, que alegou que houve uma emboscada da torcida do Botafogo no caos ocorrido no Rio de Janeiro, algo que não se provou nos relatos de moradores e comerciantes da praia do Recreio ao UOL.
"Estou aqui no Uruguai e comecei a torcer de verdade para portões fechados ou mudar de local mesmo. Lembra da Coreia do Norte, onde a TV faz uma lavagem cerebral e a maioria ama o ditador? Dá para comparar com a situação aqui. Todas as emissoras de TV numa narrativa mentirosa de que os uruguaios foram presos sem motivos e que foi uma emboscada (!!!???). A população está com isso na cabeça. Ontem, quando expliquei o que aconteceu a um Uber venezuelano que mora e trabalha aqui, ele ficou incrédulo", disse o jornalista e influencer alvinegro Medeiros, do "Canal do Medeiros".
JOGO DE BASQUETE VIRA ATO EM DEFESA AOS PRESOS
Um jogo de basquete do Peñarol na noite desta segunda (28) transformou-se num ato de defesa aos 20 presos no Rio. Uma grande faixa foi aberta na arquibancada com a frase "defenderse no es delito (se defender não é delito)".
Os próprios jogadores entraram com outra que dizia "libertad para los pibes" (liberdade para os garotos)". Mensagem esta que também virou canção entre os torcedores presentes no ginásio.
ORGANIZADAS NA ESTRADA
A maioria dos integrantes de organizadas ainda não chegou em Montevidéu. Apenas um pequeno grupo foi de avião, mas a maior parte deixou o Rio de Janeiro de ônibus na noite desta segunda-feira (28) após muito impasse diante do decreto do governo uruguaio.
Eles chegaram a cogitar cancelar a viagem e aguardaram os posicionamentos de Botafogo e Conmebol. Inicialmente, o horário de saída seria às 19h, mas somente após as instituições se manifestarem eles decidiram pegar a estrada mesmo sem certeza alguma de que estarão com permissão para entrar no estádio Campeón del Siglo.
As organizadas já estão com ingresso e contabilizam um prejuízo de R$ 44 mil caso sejam proibidos de comparecer ao jogo. Se isso acontecer, a tendência é a de que entrem com uma ação na Justiça.
BOTAFOGUENSES DESISTEM DE VIAJAR
Muitos são os relatos de botafoguenses que desistiram de viajar após o clima de insegurança. A maioria precisou pagar multa para cancelar as passagens e está no prejuízo em relação à hospedagem e ingresso já pagos.
"Só por esse clima que foi criado, eu já cancelei. Estou em Recife (PE). Já cancelei meu voo de Recife para Montevidéu e o de Montevidéu para o Rio. Paguei multa. Um da Azul e outro da Gol. O hotel eu perdi, não tem o que fazer, eles não abrem reembolso e nem cancelamento grátis. E o ingresso, se proibir a torcida do Botafogo, imagino que pelo menos vá devolver o valor, assim espero, para ficar num prejuízo menor. Ou posso entrar com um processo contra o Peñarol, contra o Governo do Uruguai... Tem que ver o que vai acontecer", disse Rafael Lima, torcedor do Botafogo.
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