Governo da Alemanha reforça sinais de que despachar imigrantes é prioridade eleitoral
BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) - A Alemanha pretende expandir um programa que dá apoio financeiro para sírios que queiram voltar ao país após 13 anos de guerra civil. A informação foi confirmada por um porta-voz do governo no mesmo dia em que Annalena Baerbock, a ministra do Exterior, visitava de surpresa a capital Damasco junto com seu colega francês, Jean-Noel Barrot.
Os dois políticos, representando a União Europeia, fizeram nesta sexta-feira (3) o primeiro contato formal do bloco com Ahmed al-Sharaa, o líder das forças rebeldes que derrubaram o governo de Bashar al-Assad há pouco menos de um mês. Em comunicado emitido apenas após seu embarque em um avião militar, por questões de segurança, Baerbock afirmou que a viagem era "um sinal claro aos sírios: um recomeço político entre Europa e Síria, entre Alemanha e Síria, é possível".
Já em Damasco, Barrot afirmou esperar por uma Síria "soberana, estável e pacífica" ao chegar à embaixada francesa em Damasco, fechada desde 2012, segundo relato da Reuters.
A investida diplomática permite também uma leitura mais local no caso da Alemanha. Imigração é um dos tópicos mais quentes da campanha eleitoral em curso. Em 23 de fevereiro, em eleição antecipada pelo fim da coalizão montada por Olaf Scholz, a população alemã irá às urnas para escolher um novo Parlamento.
Nos primeiros dias após a queda de Assad, parlamentares de diversos matizes aproveitaram o impulso do noticiário para traçar planos sobre o peso dos refugiados sírios na Alemanha, quase 800 mil se contados também os solicitantes de asilo. Herança de uma decisão histórica de Angela Merkel, que, em 2015, abriu as fronteiras do país em um momento em que a Europa ensaiava fazer o contrário.
Agora, um dirigente da CDU, partido de Merkel e do até aqui favorito para o próximo pleito, Friedrich Merz, foi um dos primeiros a lançar a ideia de pagar mil euros para quem quisesse voltar imediatamente à Síria.
A verdade é que o governo alemão já tem um programa semelhante em funcionamento. São mil euros por adulto que expressa intenção de voltar a seu país de origem mais 250 euros para despesas. O ministério do Interior, responsável pela administração de asilados, declarou nesta sexta-feira (3) que a política precisa ser ampliada, mas que a situação na Síria continua "instável demais".
A ponderação reflete o tom do governo Scholz desde a derrocada de Assad, a de que é preciso esperar por um cenário político e social mais confiável na Síria. Ao mesmo tempo, há a preocupação de que o assunto não seja levado pela narrativa da oposição, que pede e promete medidas enérgicas. Alice Weidel, candidata a premiê pela AfD, a sigla considerada de extrema direita pelos serviços de segurança alemães, bradou nos primeiros dias que era "preciso mandar essa gente para casa".
A resposta oficial, naquele momento, foi suspender a análise de novos pedidos de refúgio, em torno de 40 mil no mês passado. Medidas parecidas foram tomadas por diversos países na Europa em dezembro. Do corolário básico dos populistas no continente, em ascensão sobretudo na Alemanha, ações contra a imigração são as que mais têm sido absorvidas e sem muitos pruridos por governos e políticos de centro.
Pesquisas de intenção de voto empurram a guinada. Weidel e a Alternativa para a Alemanha, por exemplo, caminham para fazer a segunda bancada do Bundestag em fevereiro.
Em Damasco, Baerbock repetiu as reservas já feitas sobre o passado e a classificação terrorista do grupo Hayat Tahrir al-Sham, da Sharaa. "Conhecemos suas origens ideológicas, mas também estamos percebendo o desejo de moderação e entendimento com outros atores", declarou a ministra.
Baerbock, uma das principais lideranças dos Verdes na Alemanha, expressou a necessidade de o novo governo sírio demonstrar respeito por mulheres e minorias. Pediu também um prazo mais curto para a democratização do país. Sharaa declarou no último fim de semana que a Síria levaria ao menos quatro anos para voltar a ter eleições.
Barrot, o ministro francês, afirmou a jornalistas na capital síria que ofereceu ajuda técnica para o país elaborar uma nova Constituição.
ASSUNTOS: Mundo