Auditoria aponta problemas em concessão de 1,1 milhão de m² em parques da Guarapiranga
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Uma auditoria do Tribunal de Contas do Município (TCM), obtida pela Folha de S.Paulo, identificou 35 falhas no processo de concessão de sete parques municipais de São Paulo às margens da represa de Guarapiranga, que somam mais de 1,1 milhão de m².
O órgão considera que a concessão não está em conformidade com as normas legais e contratuais porque, entre outras coisas, o edital falha na justificativa da concessão e nas modelagens econômico-financeira e técnico-operacional e, por isso a concorrência não reúne condições de prosseguir. A sessão de licitação está marcada para a próxima terça-feira (15).
À Folha de S.Paulo, a gestão Ricardo Nunes (MDB) disse que "o processo segue rigorosamente as exigências legais e técnicas" e que está analisando os apontamentos realizados.
A prefeitura ainda não respondeu aos apontamentos encaminhados pelo TCM no dia 17 de dezembro. "O Tribunal aguarda agora as respostas da pasta, sem prejuízo de exercer sua competência cautelar para determinar a suspensão da licitação até a data de sua abertura", disse o órgão à reportagem.
O processo de concessão de parques banhados pela Guarapiranga teve início em 2021 e, após uma única audiência pública, em 2022, a prefeitura apresentou em 2023 a modelagem da concorrência que acabou sendo lançada só em 2024.
A lógica é a mesma de outras concessões: a prefeitura não tem dinheiro para fazer os investimentos necessários, então uma empresa privada assume a gestão dos parques pagando um valor de entrada (outorga fixa) e um repasse anual (outorga variável) e recebendo, em troca, o direito de explorar os parques comercialmente.
O TCM aponta, porém, que "não foram apresentados dados sobre as disponibilidades orçamentárias e financeiras do município que embasem a alegada restrição orçamentária para investimentos", nem "dados ou estudos aptos a embasar o argumento de que a concessão promoveria de fato uma maior eficiência na prestação dos serviços públicos e ganhos de eficiência em comparação às demais formas de contratação"
Para a prefeitura, a exploração comercial sustentável pela concessionária vai gerar receitas para a requalificação dos parques e novos empregos na região, além de oportunidade de integrar iniciativas locais de recuperação e preservação ambiental. Já o TCM alega que "não se demonstrou o nexo causal entre essas externalidades e o modelo específico de contratação proposto".
"Em suma, são alegações genéricas que poderiam fundamentar qualquer outro projeto de concessão", aponta o relatório. A escolha dos parques também não é justificada.
O edital prevê uma outorga fixa mínima de R$ 368 mil e uma outorga variável que, pela modelagem financeira, será de R$ 277 mil no ano de maturação. O plano de investimentos previstos (Capex) é estimado em R$ 38,8 milhões, menos do que o custo anual de manutenção (R$ 41 milhões). As obras devem durar quatro dos 17 anos de contrato.
A fórmula para se chegar a esses números, porém, é desconhecida, já que a prefeitura impôs sigilo em todos os documentos relacionados ao processo, o que é criticado pelo TCM, que vê descumprimento na Lei Geral de Licitações.
À Folha de S.Paulo, a prefeitura justificou o sigilo "para evitar eventuais comprometimentos à competitividade e aos objetivos da licitação".
A concessão acontece enquanto a prefeitura tenta a reintegração de posse de área do núcleo Praia do Sol do Parque Praia São Paulo, que tem ocupação irregular. O edital prevê que o município é o responsável pela liberação da área e que, se ela não ocorrer em até 12 meses, o concessionário pode solicitar o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Para o TCM, a abertura da licitação nestes termos é "injustificada e temerária", já que as disposições contratuais e as justificativas relacionadas revelam uma "predisposição em reconhecer a necessidade de reequilíbrio do contrato em favor da concessionária já na modelagem inicial do projeto." Questionada, a prefeitura não respondeu à reportagem sobre o número de edificações irregulares.
Primeiro dos parques no entorno da represa, o Guarapiranga foi criado em 1974, com projeto original do paisagista Roberto Burle Marx. Os outros cinco nasceram em 2008, como forma de preservar áreas verdes que resistiram à ocupação urbana desenfreada ao redor da represa.
Foram investidos cerca de R$ 15 milhões para a estrutura física desses parques, hoje bastante degradada. De forma geral, eles são estruturados com banheiros, campos de futebol, quadras poliesportivas, playground, academia ao ar livre e, em alguns casos, churrasqueiras. O Núcleo Atlântica existe no papel, mas nunca foi implementado.
A ideia é que o futuro concessionário construa píeres, deques, mirantes e outros equipamentos de interesse turístico ou de lazer. E obtenha recursos a partir da locação de áreas (quiosques, churrasqueiras, campos), publicidade e cobrança de entrada em atrações. O caderno de encargos sugere um passeio náutico parando em cada parque.
ASSUNTOS: Variedades