Concessão, taxa e obras em Jericoacoara viram embate entre moradores e empresa
ouça este conteúdo
|
readme
|
MACEIÓ, AL (FOLHAPRESS) - A concessão do Parque Nacional de Jericoacoara, no Ceará, gerou um embate entre moradores da Vila de Jeri e a empresa que ganhou a disputa para administrar a área, a Urbia + Cataratas Jericoacoara.
A principal discordância gira em torno da cobrança de uma taxa de acesso ao parque, única forma de acesso à vila. Inicialmente, o valor seria de R$ 50, mas moradores não seriam taxados.
A cobrança está suspensa por tempo indeterminado pela Justiça Federal.
O Conselho Comunitário de Jeri diz que mesmo quem quiser ir apenas para a vila, sem visitar o parque, teria que pagar a taxa. Moradores também questionam obras que estão sendo realizadas no parque e alegam a falta de estudo de impacto ambiental. O grupo acionou o Ministério Público sobre o assunto, mas o órgão ainda não decidiu o que fará.
No momento, estão sendo construídos um estacionamento e um centro de visitantes provisório.
O parque foi concedido para a iniciativa privada em 2024 e ficará sob gestão do consórcio por 30 anos, com investimentos estimados em até R$ 1 bilhão.
Questionada, a Urbia + Cataratas Jericoacoara disse que está cumprindo integralmente o contrato de concessão firmado com o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade).
"A Concessão visa a implementação de melhorias tanto na sustentabilidade quanto na infraestrutura da área de uso público. O foco principal é fornecer ao parque a infraestrutura necessária, equilibrando os diversos usos com as condições ambientais, assegurando a sua sustentabilidade a longo prazo. Todas as intervenções realizadas estão em conformidade com o Plano de Manejo da Unidade de Conservação e foram precedidas de estudos técnicos e aprovações expressas do ICMBio", afirmou a empresa em nota.
A concessionária também reiterou que os valores e as condições da taxa foram definidos pelo ICMBio, e que ela só passará a ser cobrada quando o contrato entrar em vigor, o que ainda não tem data definida.
Diz ainda que a taxa é "essencial para garantir que a concessionária assuma todos os custos operacionais relativos à gestão do uso público, além de viabilizar a realização dos investimentos e manutenções previstas".
Também por nota, o ICMBio disse que o projeto de concessão não prevê taxas de acesso e sim um ingresso para os visitantes do parque. Afirmou que podem ser necessários estudos de potenciais impactos para algumas obras.
Para a presidente do Conselho Comunitário de Jeri, Lucimar Vasconcelos, a cobrança da taxa por parte da empresa é abusiva, já que deveria ser feita apenas para quem visita os ativos do parque, e não para quem vai para a vila.
"Nosso produto da vila são os turistas. Eles não vêm para fazer trilha no parque, eles vêm para a vila. É lá que ele tem onde dormir, por exemplo", afirma. Ela destaca que um parecer do TCU (Tribunal de Contas da União) de 2022 apontou que uma característica singular dessa unidade de conservação é justamente a vila.
O Conselho defende uma mudança no formato da concessão e que a cobrança da taxa seja revista.
O documento aponta que o Parque Nacional de Jericoacoara "não possui infraestrutura para o turismo, sendo que a infraestrutura de apoio à visitação disponível está localizada na Vila de Jericoacoara, não na área do parque".
Além do valor que seria cobrado pela entrada pelo parque, turistas precisam pagar uma taxa de turismo sustentável à prefeitura de Jijoca de Jericoacoara, no valor de R$ 41,50 por até dez dias de permanência.
A previsão é de que a nova taxa de acesso ao parque chegue a R$ 120 ao dia em 2029.
"Essa cobrança vai impactar milhares de pais e famílias que vivem do turismo de Jericoacoara, além dos empreendimentos que pagam caro para se manter aqui. Se for uma família de cinco pessoas que vier visitar a vila, ela vai gastar R$ 250 por dia? Claro que não. O turismo vai embora", diz Lucimar.
No dia 5 de dezembro, a prefeitura de Jijoca de Jericoacoara embargou uma obra no parque por falta de autorização. Dias depois, o ICMBio anunciou que a operação da concessão seria adiada por 90 dias. O prazo acabou na última terça-feira (18), mas nenhuma decisão foi tomada ainda de quando o contrato será retomado.
O órgão federal diz que autorizou as obras no parque, e que elas "têm como objetivo implantar as infraestruturas voltadas ao uso público e à conservação ambiental, com um cronograma total de execução estimado em 36 meses."
No momento, as obras acontecem no município de Cruz, vizinho a Jijoca. O parque também possui área em Camocim.
Professor da Universidade Federal do Ceará, Marcelo Soares diz que é preciso estudar alternativas para o parque que causem menos problemas ambientais. "Atualmente, o trânsito de veículos para Jeri é feito próximo à praia e em áreas alagadas durante a chuva e marés altas. Esse trajeto é longo, por cerca de 11 quilômetros, e ocorre em múltiplas vias off-road de modo desordenado passando por ambientes sensíveis. Isso leva a impactos na fauna e flora no parque nacional devido ao turismo de massa."

ASSUNTOS: Variedades