Defesa de suspeito de matar Vitória diz ver descaso e erros de procedimento na investigação
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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um mês depois do desaparecimento de Vitória Regina de Sousa, 17, laudos periciais que podem comprovar o envolvimento do único preso na cena do crime ainda padecem de conclusão. O que se sabe é que a Polícia Civil de Cajamar (Grande SP) diz ter convicção de que ela foi morta pelo operador de empilhadeira Maicol Antonio Sales dos Santos, 23, e que ele agiu sozinho.
A defesa dele nega sua participação e critica o andamento das investigações.
Os advogados afirmam que Maicol é inocente e que outros elementos que surgiram ao longo da apuração estão sendo deixadas de lado. Como outras pessoas que estiveram no entorno de Vitória momentos antes do desaparecimento na noite de 26 de fevereiro.
O advogado de Maicol, Arthur Perin Novaes, conversou com a Folha de S.Paulo na quarta-feira (26) e manifestou incômodo com a entrevista coletiva realizada pelos delegados Luiz Carlos do Carmo e Fabio Lopes Cenachi, que anunciaram no dia 18 que o preso havia confessado o crime. Na avaliação de Perin, ao chamarem Maicol de "jack", gíria para estuprador, os policiais colocaram a vida do suspeito em risco. Exame realizado pela Polícia Técnico Científica afastou a possibilidade de Vitória ter sofrido violência sexual ao ser morta. O corpo dela foi encontrado em uma área de mata em Cajamar no dia 5.
"O Maicol foi ouvido duas vezes na polícia, em momento algum denotou qualquer participação. Na sua confissão, na qual não estavam presentes os advogados, foi apresentada uma versão, não sei se foi dada por ele ou se foi dada pela Polícia Civil, eu não estava presente. E nesse ato ele diz que teve a participação. A defesa não reconhece, foi um interrogatório absolutamente nulo", disse Perin.
Procurada para comentar, a Secretaria da Segurança Pública do estado afirma que a investigação da Delegacia de Cajamar sobre a morte da jovem está sendo conduzida com "rigor técnico e dentro dos protocolos legais". Conforme a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), "todas as linhas de apuração são analisadas" e "as evidências colhidas sustentaram a prisão do suspeito".
Maicol está preso em um centro de detenção provisória em Guarulhos. Seus advogados têm ido até o local na tentativa de acompanhar de perto o tratamento a ele dispensado. Eles temem por sua integridade no sistema prisional paulista.
Ao confessar o crime, segundo o termo de interrogatório, Maicol disse que teria oferecido uma carona para Vitória para pedir que ela não contasse à atual esposa dele sobre uma "troca de carinhos" entre eles há cerca de um ano e meio. Durante a conversa, Vitória teria se exaltado e passado a agredi-lo. Ele então contou ter pegado uma faca que transportava no automóvel e atingido a jovem duas vezes. A adolescente teria morrido na hora.
A defesa refuta a versão. Perin relata ter ouvido do suspeito que naquela noite arrumou o banco da motocicleta de um amigo. Ele chegou a sair para buscar grampos para concluir o reparo. Depois, assistiu ao jogo do Corinthians, mandou uma mensagem para sua esposa e dormiu. O advogado afirma que o casal não morava junto, mas estava para se mudar para uma casa nova em breve.
Perin disse que Maicol negou ter tido relacionamento anterior com Vitória. "Ele disse que a conhecia de vista. É um bairro muito pequeno, então é natural que todo mundo se conhecia de vista, mas nenhum contato grande com ela."
Um ponto levantado pela defesa é uma possível ausência de investigação sobre outros atores que estiveram próximos de Vitória naquele dia.
"Na noite que ocorreu a tragédia da Vitória, ela veio a mandar uma mensagem para uma amiga, falando que havia dois rapazes no ônibus e ela estava com muito medo. Esses dois rapazes sequer foram ouvidos de uma forma bem feita", afirma.
"Também, três rapazes num carro, perto do ponto de ônibus em que ela desceu, mexeram com ela, isso ficou registrado, e após isso eles se dirigiram para um prostíbulo. Também nenhuma linha investigativa clara, ou digamos com certa intensidade, foi tomada em relação a isso", acrescenta.
A reportagem teve acesso ao depoimento deles. O trio prestou esclarecimentos em 3 de março, ou seja, antes de o corpo ser encontrado. Eles narraram que seguiam em um Toyota Yaris por uma via da cidade quando, por volta das 23h30, viram uma mulher em um ponto de ônibus. Eles afirmaram para os policiais que não conheciam. Um deles teria achado a jovem bonita e feito um elogio. O grupo teria ido um pouco mais adiante com o automóvel e retornado, para que o mesmo homem conversasse com Vitória, o que não ocorreu por ele ter ficado com vergonha.
Para a defesa, a investigação é tão confusa que até o pai de Vitória foi citado no inquérito em um primeiro momento.
"Não estou falando se Maicol é culpado ou inocente, o que cabe à Justiça [julgar]. Estou aqui para representar os melhores interesses dele e apontar, de fato, os diversos erros procedimentais em curso da investigação. Até o pai da Vitória foi tratado como suspeito, por ele não ter chorado demais no velório. Isso é um absurdo, uma família que, além de conviver com o luto, ainda tem que conviver com uma suspeita sobre a morte da própria filha."
Laudos que podem comprovar se havia sangue ou cabelo de Vitória no carro de Maicol ainda estão pendentes. Uma perícia psiquiátrica em Maicol foi pedida pelo delegado Cenachi e recusada pela Justiça
"Vamos analisar sob quais circunstâncias esse sangue foi colhido e fazer uma eventual impugnação. Qualquer prova apresentada pela Polícia Civil será questionada pelos descasos que estão fazendo na investigação", diz Perin.

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