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Gestão Nunes desovou obras às vésperas da eleição, mas não cumpriu metas de Bruno Covas

Por Folha de São Paulo

31/12/2024 9h45 — em
Variedades



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O anúncio repetia a cada horário eleitoral o slogan "Ricardo fez" e as imagens aéreas de canteiros de obras nas eleições deste ano. Dono do maior tempo de televisão e rádio, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), tentou fisgar o eleitorado com uma imagem de trabalhador.

Nos debates, ele repetia que o seu governo conduzia mais de oito mil obras pela cidade. E teve êxito no pleito.

Nunes completa o atual mandato com serviços entregues em áreas como mobilidade, saúde e moradia, assim como a implementação de programas bastante perceptíveis à população -entre eles, o tarifa-zero aos domingos e a ampliação da rede Descomplica SP, espécie de Poupatempo municipal.

No entanto, o prefeito não conseguirá cumprir com o Programa de Metas estabelecido pelo quadriênio 2021 a 2024, na época desenhado pelo então prefeito eleito Bruno Covas.

Das 86 metas estabelecidas no programa, a gestão Nunes atingiu 54 metas (63%) até o começo deste mês, sendo que outras 13 estão dentro do cronograma e deverão ficar prontas até o dia 31 de dezembro. Caso cumpra com este prazo, o emedebista conseguirá alcançar 78% das metas desenhadas por Covas. Os dados fazem parte do Painel de Monitoramento do governo.

No início de 2023, a gestão já havia feito uma revisão para suavizar o seu compromisso em 27 metas. Nunes desistiu, por exemplo, de inaugurar quatro terminais de ônibus e dois corredores BRT, além de construir 11 piscinões em locais afetados pelas enchentes.

Promessas nas áreas de educação e na cultura não serão concretizadas. Entre elas, a de garantir a alfabetização das crianças da rede municipal de ensino até o 2º ano do ensino fundamental e a de melhorar a avaliação da rede de ensino no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação).

O Ideb 2023 da rede paulistana caiu de 5,7, em 2021, para 5,6 no ano passado. E no ranking Criança Alfabetizada, do Ministério da Educação (MEC), São Paulo ocupa a 21ª posição entre as capitais.

Nunes, que assumiu a prefeitura em decorrência da morte de Bruno Covas (PSDB), contou com orçamentos recordes em todo o mandato. As receitas foram de R$ 68 bilhões (R$ 87 bilhões, em valores atualizados), em 2021, para R$ 111 bilhões neste ano.

As entregas começaram a ser desovadas somente no ano pré-eleitoral. O prefeito apostou as fichas na revitalização de avenidas e ruas e, também, acelerou a construção de moradias sociais.

Foram 48 mil habitações entregues até o começo deste mês, ante 20 mil em dezembro de 2022. A meta é de 49 mil moradias no quadriênio.

A prefeitura deu vazão ao processo de regularização fundiária, beneficiando 166 mil famílias de baixa renda no fim do mandato -há dois anos, só 19 mil famílias haviam sido contempladas. Ainda assim, Nunes está distante de alcançar o objetivo de 220 mil famílias previsto no Programa de Metas.

Na capital com déficit habitacional estimado em 369 mil domicílios, a moradia foi um tema central no embate eleitoral entre Nunes e o deputado federal Guilherme Boulos (Psol).

Na saúde, foram 89 novos equipamentos construídos, 54 a mais em comparação com o final de 2023.

O emedebista gaba-se por chegar ao final de 2024 com mais de 20,3 bilhões de metros quadrados de vias recapeadas. Até dezembro de 2022 haviam sido revitalizados no máximo 3,5 bilhões de metros quadrados.

Nunes entrou na mira do Ministério Público depois de remanejar R$ 549 milhões do orçamento público para o programa de pavimentação e recapeamento de vias. Apenas para este ano há mais de R$ 1,6 bilhão previsto para a dotação de pavimentação e recapeamento de vias.

O malabarismo no orçamento fez com que o promotor Silvio Antonio Marques instaurasse inquérito para apurar se houve ato de improbidade administrativa nas obras de recapeamento e, como escreveu o promotor Silvio Antonio Marques, com "finalidades eleitorais, visando o pleito de 2024".

Apesar da ambição do prefeito, o tema "buraco e pavimentação" é o terceiro o maior número de queixas na Ouvidoria da prefeitura. Entre janeiro e setembro deste ano, foram 2.900 registros.

Os contratos para o recapeamento de ruas e avenidas e a manutenção de malha viária foram utilizados pela gestão para inflar as mais de 8.000 obras que Nunes se referia nos debates eleitorais.

Das 8.390 obras cantadas pelo prefeito, 6.883 (82%) são referentes aos reparos de manutenção e requalificação. E apenas 1.365 delas, o equivalente a 16%, são classificadas pelo próprio governo como obras novas.

O governo finalizou 6.490 obras (77%) e, numa corrida contra o relógio, lida com 1.797 construções em andamento e 103 paralisadas, em decorrência, por exemplo, de decisões judiciais e rescisão de contratos.

No Ministério Público, o prefeito é alvo de 107 representações e que estão ainda sob apuração -os dados foram informados pelo próprio órgão à reportagem.

Boa parte das queixas referem-se às contratações feitas pela prefeitura com dispensa de licitação e pede apuração de supostos favorecimento de empresas, falta de planejamento da Siurb (Secretaria de Infraestrutura e Obras) como justificativa para contratação emergencial, indício de formação de cartel e de superfaturamento.

Como a Folha de S.Paulo revelou, os contratos emergenciais feitos pela Siurb dispararam de R$ 10 milhões, em 2017 (na gestão Doria), para R$ 2 bilhões, em 2022. É o que diz relatório do TCM (Tribunal de Contas do Município).

À reportagem na época, a gestão Nunes disse que "todas as obras foram acompanhadas de forma eficaz pelos engenheiros fiscais da Siurb, sem quaisquer intercorrências".

A proliferação das obras com dispensa de licitação serviu de munição para os adversários de Nunes, assim como o seu envolvimento no caso conhecido como "máfia das creches", iniciado em 2019.

No apagar das luzes do mandato, em novembro, a Polícia Federal obteve autorização da Justiça para investigar o prefeito.

A suspeita da corporação é de que entidades gestoras de creches teriam recebido de volta parte do dinheiro contabilizado como despesas com materiais. As empresas faziam os repasses via cheques, depósitos e boletos, beneficiando pessoas ligadas à administração dessas entidades.

Nunes e uma empresa de sua família, a Nikkey Serviços S/S Ltda, receberam em 2018 mais de R$ 30 mil em valores de uma dessas empresas investigadas. O prefeito sempre alegou que se tratou de uma prestação de serviços.

A Folha de S.Paulo revelou, em julho deste ano, um vídeo no qual uma investigada no caso, Rosângela Crepaldi, descarta a prestação de serviços por Nunes e diz ter atuado na devolução desses valores a pessoas ligadas às ONGs. Na época dos supostos desvios, Nunes era vereador da capital.

No processo, a defesa do prefeito alegou que a continuidade das investigações tem teor político. Ao saber que será investigado, Nunes diz que "não tem nada de errado" e "isso será novamente arquivado".


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