Indígenas têm ações afirmativas específicas em 50% das universidades públicas
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Metade das 106 universidades públicas do país contava com ações afirmativas formuladas especificamente para a população indígena em 2019, segundo levantamento realizado pelo Gemaa (Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa), ligado ao Iesp/Uerj (Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro).
Segundo o estudo, 53 instituições de ensino distribuídas em 18 estados tinham políticas afirmativas específicas para essa população. Desse total, 23 universidades federais tinham arranjos que extrapolavam o previsto pela Lei 12.711/2012, a Lei de Cotas, e outras 30 universidades estaduais haviam criado leis específicas para indígenas.
Ações afirmativas pensadas especificamente para a população indígena, diz o estudo, são necessárias porque a educação de base desses povos é diferente do modelo de ensino tradicional.
Um exemplo de instituição cujo processo seletivo vai além do exigido pela Lei de Cotas, aponta o Gemaa, é a UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados), em Mato Grosso do Sul, com redação e prova oral feitas na língua guarani. Entre os estados, o Paraná foi pioneiro na formulação de uma política de ação afirmativa específica para indígenas em cursos regulares da graduação, ainda em 2001 -antes das primeiras políticas de cotas voltadas para pretos e pardos.
O mapeamento feito pela Gemaa não incluiu as vagas ofertadas pela Lei de Cotas porque, de acordo com os pesquisadores, não há como saber quantas delas são destinadas a esse público específico nas federais. O grupo entra no recorte racial dos PPIs (Pretos, Pardos e Indígenas), mas os editais e outros documentos relacionados à oferta dessas vagas não apresentam essa informação separadamente.
A Lei de Cotas não é, segundo o estudo, suficiente para incorporar totalmente os indígenas ao ensino superior, pois há universidades federais que aplicam apenas a lei geral, ou seja, reservam vagas, mas não oferecem outros subsídios para que o indígena frequente e conclua o curso.
"A maneira como as cotas para PPIs são dispostas nas universidades federais, sem que as regras de distribuição das vagas para cada grupo sejam devidamente explicitadas, também estimula uma competição desnecessária entre esses grupos raciais que experimentam, ainda que de modos distintos, desvantagens no campo educacional formal desde o ensino fundamental", diz Jefferson Belarmino de Freitas, pesquisador e subcoordenador do Gemaa.
"Contudo, se há críticas quanto à efetividade da Lei 12.711 para a inclusão de indígenas, a situação poderia estar ainda pior sem a mesma", diz o pesquisador.
O estudo constatou que, nas 53 universidades com essas políticas, a proporção de vagas formalmente reservadas para indígenas supera a proporção da população de indígenas nos estados, o que acontece, em grande parte, porque o grupo que se declara indígena nos estados é bastante reduzido, ficando abaixo de 1% na maioria dos casos.
O levantamento também traz o IIR (Indice de Inclusão Racial), que avalia a eficacia inclusiva das políticas de ação afirmativa para indígenas nas 53 universidades examinadas. Quanto mais proximo de 1, mais a proporção de indígenas na universidade reflete a proporcao do grupo na populacao da unidade federativa correspondente.
Roraima é o único caso em que a proporção da reserva fica um pouco abaixo da populacional (0,94%). O dado chama atenção, pois é o estado com maior proporção de população indígena (11%) entre os casos analisados.
O Amazonas é o segundo estado em que a população indígena é proporcionalmente maior (4,84%), e o seu IIR é de 1,15. No geral, os estados da região Norte, que concentra a maior população indígena do país, são os que têm os IIRs mais baixos se comparados aos de outras regiões.
O estudo recomenda mais investigação do acesso e da manutenção de indígenas nas universidades. "A questão é que não basta selecionar, mas manter essa população nas universidades, concedendo, por exemplo, uma bolsa estudantil para que o indígena consiga pagar aluguel, transporte e se alimentar durante os anos de estudo. Ou ainda a criação de mais cursos próximos às comunidades para facilitar o deslocamento. Há muitos desafios a serem superados", diz Freitas, do Gemaa.
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