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Países planejam para 2030 o dobro da produção de combustíveis fósseis permitida pelo Acordo de Paris

Por Folha de São Paulo

09/11/2023 8h00 — em
Variedades



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Planos governamentais de todo o mundo indicam que a produção de combustíveis fósseis em 2030 deve ser o dobro do que seria permitido para cumprir o Acordo de Paris.

Um novo relatório, publicado nesta quarta-feira (8), aponta que países devem produzir 110% mais petróleo, gás e carvão no final da década do que seria necessário para limitar o aquecimento global a 1,5°C e 69% mais do que seria consistente com um planeta 2°C mais quente.

Esses percentuais se traduzem, respectivamente, em 22 GtCO2eq (bilhões de toneladas de gás carbônico equivalente, unidade de medida que soma os gases que causam o aquecimento global) e 17 GtCO2eq a mais emitidos em relação ao que seria necessário para cumprir as metas de temperatura.

As projeções apontam ainda que até 2050 a magnitude da lacuna de produção chegue a cerca de 29 GtCO2eq e 22 GtCO2eq, respectivamente.

O Acordo de Paris, firmado em 2015, tem como objetivo manter o aumento da temperatura média global "bem abaixo dos 2°C acima dos níveis pré-industriais e buscar esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C". A medida é necessária para reduzir significativamente os riscos e impactos das mudanças climáticas.

Esta é a quarta edição do relatório da Lacuna de Produção, elaborado desde 2019 para mostrar a grande discrepância entre a produção planejada de combustíveis fósseis pelos países e os níveis de produção globais necessários para frear a crise do clima.

O documento é produzido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Instituto Ambiental de Estocolmo (SEI, na sigla em inglês), Climate Analytics, E3G e Instituto Internacional para o Desenvolvimento Sustentável.

A ciência aponta há décadas que é essencial que haja um corte drástico na quantidade de dióxido de carbono que é jogada na atmosfera para evitar um aquecimento catastrófico do planeta. Apesar disso, as emissões de CO2 --quase 90% das quais são provenientes de combustíveis fósseis-- continuam crescendo e chegaram a um novo recorde em 2022.

A nova análise leva em consideração os planos de 19 dos principais países produtores de combustíveis fósseis: Alemanha, Arábia Saudita, Austrália, Brasil, Canadá, Cazaquistão, China, Colômbia, Emirados Árabes, Estados Unidos, Índia, Indonésia, Kuwait, México, Nigéria, Noruega, Qatar, Reino Unido e Rússia.

Juntos, respondem por cerca de 80% da produção global de petróleo, gás e carvão. Esses dados foram, então, extrapolados para calcular uma estimativa global sobre o cenário futuro deste setor.

Entre estas nações, estão disponíveis as projeções governamentais para 9 países produtores de carvão (que representaram 93% da produção global em 2021), 17 países produtores de petróleo (74% da produção mundial) e 18 países produtores de gás (72% da produção global).

O levantamento diz que os principais países produtores de combustíveis fósseis se comprometeram a alcançar emissões líquidas zero e lançaram iniciativas para reduzir as emissões dessa produção, mas destaca: nenhum deles assumiu compromissos coerentes com o necessário para limitar o aquecimento a 1,5°C.

Ploy Achakulwisut, uma das principais autoras do estudo e cientista do SEI, aponta que a lacuna entre a produção de fósseis e a redução de emissões acordada no Acordo de Paris conflita com as metas climáticas e os compromissos de zerar emissões líquidas anunciados pelos países.

"Concluímos que a dimensão da lacuna de produção permaneceu praticamente inalterada em comparação com as nossas avaliações anteriores", diz. "Assim, apesar dos sinais encorajadores de que há uma transição emergente para energias limpas, a persistência da lacuna de produção global coloca em risco uma transição energética bem gerida e equitativa."

O secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), António Guterres, diz que o novo relatório é uma "acusação alarmante do descuido climático descontrolado". "Os governos estão literalmente dobrando a aposta na produção de combustíveis fósseis; isso significa o dobro de problemas para as pessoas e para o planeta", declara.

"Não podemos enfrentar a catástrofe climática sem atacar a raiz do problema: a dependência dos combustíveis fósseis. As emissões de combustíveis fósseis já estão causando o caos climático que devasta vidas e meios de subsistência, e estamos a caminho de algo muito pior."

A POSIÇÃO BRASILEIRA

O Brasil é um dos que ajudam a puxar para cima essa tendência. O país é hoje o oitavo no mundo na produção de óleo, 27º na produção de gás e 29º de carvão.

Em março, porém, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, anunciou planos para escalar a produção nacional e tornar o Brasil o quarto maior produtor global de petróleo.

Na mesma semana, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, disse em entrevista à agência de notícias Bloomberg que a estatal "vai ganhar participação de mercado". "Podemos ser os últimos a produzir petróleo no mundo", afirmou.

Tanto a pasta quanto a petroleira estão no centro da polêmica em torno da exploração da bacia da Foz do Amazonas, que fica na chamada margem equatorial brasileira, considerada pela indústria uma nova fronteira. O início da perfuração depende de parecer do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais).

Silveira também vem anunciando incentivos à ampliação do mercado de gás no país e já se referiu ao petróleo e ao gás como "a riqueza do povo brasileiro que está no subsolo".

"Sem medidas para promover sua exploração e produção, não há empregos, renda ou desenvolvimento regional. Temos uma janela de oportunidade, não podemos perder o novo pré-sal que pode estar na margem equatorial e que será o passaporte para o futuro das regiões Norte e Nordeste do Brasil", disse em comunicado no início do ano.

O plano energético brasileiro prevê que a produção de petróleo cresça 63%, e a de gás, 124% entre 2022 e 2032, diz o Relatório da Lacuna de Produção.

TRANSIÇÃO ENERGÉTICA PRECISA SER ACELERADA

Apesar de o relatório tratar de duas dezenas de países, a contribuição dos maiores produtores é muito superior à dos outros. Três nações respondem por cerca da metade das emissões globais de gases-estufa provenientes da extração de combustíveis fósseis: China, Estados Unidos e Rússia.

Segundo dados da Agência Internacional de Energia, a China produz, assim como consome, cerca da metade do suprimento mundial de carvão.

Por sua vez, os EUA, a Rússia e a Arábia Saudita produzem cerca de 40% do petróleo mundial, enquanto americanos e russos são, de longe, os maiores produtores de gás do mundo.

O documento destaca que é preciso que os governos adotem metas de redução a curto e a longo prazo para a produção e utilização de combustíveis fósseis -e que aqueles com maior capacidade de transição para fontes renováveis devem fazer cortes mais rápidos.

"Uma transição equitativa da produção de combustíveis fósseis deve reconhecer as responsabilidades e capacidades diferenciadas dos países. Os governos com maior capacidade de transição devem procurar reduções mais ambiciosas e ajudar a financiar os processos de transição em países com capacidades limitadas", diz.

Esse tipo de divisão de responsabilidades deve ser tema de discussões em algumas semanas, durante a COP28, a cúpula do clima da ONU, que acontece a partir de 30 de novembro em Dubai, nos Emirados Árabes -uma potência petroleira que produz, em média, 3,2 milhões de barris por dia.

Assim como a bandeira levantada pela Petrobras, a COP reunirá outros grandes produtores que disputam a posição de quem vai ser o último a parar de extrair combustíveis fósseis.

"Esse é o cerne do problema. Os principais produtores não estão dispostos a fazer a transição da produção de combustíveis fósseis facilmente", afirma Achakulwisut.


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O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

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