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Secretários da saúde de SP alertam para risco de desassistência na troca de gestões municipais

Por Folha de São Paulo

31/12/2024 9h45 — em
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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um levantamento do Cosems/SP (Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo) revela um cenário de instabilidade no processo de transição de gestores municipais, após as eleições de outubro, e alerta para o risco de falta de assistência e descontinuidade de políticas públicas do SUS.

Quatro em cada dez (41%) municípios paulistas estarão sob nova gestão a partir de janeiro de 2025, um total de 265 cidades. Outros 14% estão em situação de sucessão administrativa (quando o prefeito elege o sucessor) e 44% tiveram seus prefeitos reeleitos.

Entre as principais queixas de novos gestores da saúde que assumirão o cargo a partir do próximo dia 1º estão a falta de acesso a informações, por exemplo, a situação dos contratos de pessoal e de suprimentos, o que é essencial para o planejamento das ações de saúde.

"Em muitos locais, não está havendo uma transição de governo de maneira republicana, respeitosa e cordial. Infelizmente alguns políticos não pensam na comunidade, estão pensando na política partidária. Isso é uma grande preocupação", diz Tiago Texera, diretor financeiro do Cosems/SP e que assumirá a secretaria de saúde de Itu (SP) em janeiro.

Segundo ele, embora existam regras para transição, há descumprimento por parte dos atuais gestores. Ele afirma que muitos prefeitos não reeleitos deixaram de renovar contratos no final do mandato. "Não renovam para que o próximo não consiga garantir assistência de maneira correta para a comunidade." Não há, porém, um levantamento oficial sobre esse cenário no estado.

À reportagem o secretário de Estado da Saúde de São Paulo, Eleuses Paiva, disse estar muito preocupado com uma eventual descontinuidade das políticas de saúde nesse período de transição e afirma que, em janeiro e fevereiro, serão feitas oficinas com os novos secretários municipais para que não haja perda de ações em andamento.

Há várias situações que colocam em risco as ações de saúde durante as trocas de prefeitos. É comum, por exemplo, haver demissões de profissionais da saúde terceirizados devido a ajustes de contas, o que leva à redução das equipes na atenção primária e à desassistência.

Um estudo do Ieps (Instituto de Estudos de Políticas de Saúde) demonstrou que a taxa de mortalidade infantil aumenta, em média, 6,7% quando o segundo trimestre de gestão coincide com períodos de transição de governos municipais em eleições acirradas.

Também há redução nas consultas de pré-natal e nos exames para a detecção das ISTs (infecções sexualmente transmissíveis), o que amplia os riscos para mães e bebês.

"Por que em períodos eleitorais e pós-eleitorais os indicadores de saúde pioram? Porque até o dia da eleição eu tenho um nível de assistência. Se eu perco, a assistência diminui porque diminui o acesso. E toda vez que a gente diminui o acesso, a tendência dos indicadores de saúde que medem assistência ou a qualidade da assistência é de piora", afirma Texera, do Cosems/SP.

De acordo com o estudo do Ieps, há uma redução de 3% nas contratações no período eleitoral, entre outubro e janeiro, e um aumento de 9% nas demissões. Médicos, enfermeiros e agentes comunitários de saúde estão entre os profissionais mais demitidos no período.

João Abreu, CEO da Impulso, organização sem fins lucrativos que dá apoio gratuito aos municípios para o uso inteligente de dados e tecnologia no SUS, afirma que, em trocas de gestão, também é comum haver muita perda de informações.

"Não muda só o secretário ou a secretária da saúde, muda também um escalão abaixo, o que afeta a coordenação da atenção primária, por exemplo. Há uma demora grande para voltar ao patamar de conhecimento anterior justamente pela falta de uma transição adequada."

Segundo ele, em geral, nessas trocas saem pessoas técnicas importantes, que supervisionam e orientam o trabalho de equipes de saúde do município. "É muito importante ter um profundo conhecimento sobre como funciona o SUS, quais são as necessidades de saúde pública daquele município."

Abreu lembra que, além das questões assistenciais, a descontinuidade na gestão pode prejudicar também o controle de endemias, por exemplo, a dengue, que depende diretamente de ações municipais.

"Se você já viveu isso dez vezes, você tem muito mais condição de saber o que dá certo e o que não dá naquele município. Se você não tem essa experiência, fica à mercê de dados muito bem organizados, que, infelizmente, são raros de se encontrar."

A organização da saúde no estado está estruturada em regiões, compostas por 17 DRS (Departamentos Regionais de Saúde) e 62 CIR (Comissões Intergestoras Regionais), que são instâncias colegiadas para a tomada de decisões em nível municipal e estadual.

Cada uma dessas estruturas tem um papel distinto, autônomo e interdependente, e a descontinuidade política pode afetar essa organização, segundo o Cosems.

O estado tem ainda 18 RAS (Redes de Atenção à Saúde), com diferentes densidades tecnológicas e integradas por meio de apoio técnico, logístico e de gestão. Dessas RAS, 9 (50%) cobrem municípios que terão mudanças de gestão.

De acordo com o relatório, a situação é especialmente crítica em regiões como a Grande São Paulo, que inclui áreas como o ABC Paulista e o Alto Tietê, devido à densidade populacional e às demandas crescentes. Outro exemplo é a RAS que abrange dois DRS (São José do Rio Preto e Araçatuba), com 142 municípios (22% do estado) e que conta com 53,5% de gestores novos ou em sucessão.

O secretário Eleuses Paiva reforça que, nesse processo de regionalização da saúde, em que cada região tem autonomia para avaliar seus vazios assistenciais e buscar soluções, o cumprimento de acordos previamente feitos com municípios são fundamentais. "É grande a nossa preocupação com eventuais descontinuidades."

Ele diz que a gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos) aumentou o valor do PAB (Piso da Atenção Básica) paulista de R$ 4 por habitante/ano para valores que variam entre R$ 15 a R$ 40, de acordo com o cumprimento de metas pelos municípios, em áreas como cobertura vacinal, pré-natal e controle de hipertensão e diabetes.


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